TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
454 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL artigo 20.º, n.º 4, em conjugação com o artigo 18.º, n.º 2, ambos da Constituição, e do direito à justa repa- ração dos danos, decorrente do artigo 2.º da Constituição». Já no seu Acórdão n.º 273/15, o Tribunal considerou a mesma norma organicamente inconstitucio- nal, por «violação da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República em matéria de direitos, liberdades e garantias prevista no artigo 165.º, n.º 1, alínea b) , da Constituição» (com referência ao direito à prova, ínsito no direito à tutela jurisdicional efetiva). Conforme decorre das respetivas fundamentações, na base de tal diferença está uma distinta avaliação relativamente à legitimidade da restrição dos meios de prova admissíveis nas ações para efetivação de respon- sabilidade civil decorrente de acidentes de viação, com eventual projeção no âmbito de proteção do princípio da igualdade (cfr. as conclusões 4.ª, 6.ª, 7.ª, 8.ª e 10.ª da alegação do recorrente e as conclusões 2.ª e 4.ª da contra-alegação dos recorridos). Dada a invocação expressa pela decisão recorrida do juízo positivo de inconstitucionalidade formulado no Acórdão n.º 382/12, e considerando igualmente as conclusões do recorrente, importa começar por cote- jar a norma desaplicada com o direito à tutela jurisdicional efetiva. 6. Para o efeito, é de corroborar o enquadramento realizado nesse aresto, o qual se conforma com a jurisprudência reiterada deste Tribunal: «O direito fundamental de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva corresponde a um alicerce estru- turante do Estado de Direito democrático, que se traduz na faculdade de obter, pela via judiciária, a garantia de proteção e realização de direitos e interesses legalmente protegidos, nomeadamente através de uma solução justa de conflitos, com observância de imperativos de imparcialidade e independência. De entre as várias dimensões em que se desdobra o direito à tutela jurisdicional efetiva, salienta-se, como alvo da presente análise, a garantia de um processo equitativo, por ser essa a vertente que mais se evidencia como poten- cialmente beliscada pela interpretação normativa posta em crise. O princípio da equitatividade é expressamente referido no n.º 4 do artigo 20.º da Lei Fundamental, que dispõe o seguinte: “Todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objeto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo.” 10. O direito fundamental a um processo equitativo pressupõe uma estrutura processual adequadamente con- formada aos fins do processo, que conduza ao seu desenvolvimento em condições de equilíbrio, direcionada à obtenção de uma decisão ponderada, materialmente justa do litígio, que proporcione aos interessados meios efe- tivos de defesa dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos (Acórdão n.º 632/99). Da conformação justa e adequada do processo – de um processo equitativo – dependerá a efetividade do direito à tutela jurisdicional. Um processo equitativo implica uma dialética, em que cada uma das partes tenha a possibilidade, em igualdade de armas, de apresentar a sua versão e os seus argumentos, de facto e de direito, oferecer provas e pronunciar-se sobre os argumentos e material probatório carreado pela parte contrária, antes da prolação da decisão judicial. No âmbito do direito a um processo equitativo, está compreendido um “direito constitucional à prova” abran- gendo “o direito à prova em sentido lato (poder de demonstrar em juízo o fundamento da própria pretensão) e o direito à prova em sentido restrito (alegando matéria de facto e procedendo à demonstração da sua existência)”(J. J. Gomes Canotilho, Estudos sobre Direitos Fundamentais , 2.ª edição, Coimbra Editora, 2008, p. 170). Na síntese de M. Teixeira de Sousa, a prova pode ser definida como a atividade direcionada, num processo, à “demonstração convincente (…) de uma afirmação de facto”, com o objetivo de contribuir para que, na mente do julgador, se forme a convicção sobre a realidade dos factos relevantes para a decisão (cfr. M. Teixeira de Sousa, As partes, o objeto e a prova na ação declarativa , Lex, Lisboa 1995, p. 195).
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