TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
475 acórdão n.º 566/18 § 30. Pelo que há uma total coincidência entre o critério normativo aplicado na decisão recorrida e o critério normativo. § 31. Advertiu ainda o Exmo. Senhor Juiz Conselheiro Relator que a questão de inconstitucionalidade ora em análise poderia vir a não ser conhecida por uma alegada violação dos artigos 70.º, n.º 1, alínea b) , e 79.º-C, da LTC, na medida em que poderá existir uma inidoneidade do objeto do recurso, por, não obstante o enunciado linguístico, estar em causa materialmente a impugnação da própria decisão recorrida. § 32. O objeto do recurso, tal como formulado pela recorrente quanto a esta específica questão de inconstitu- cionalidade, é muito claro quanto ao que pretende: a apreciação de uma inconstitucionalidade normativa, decor- rente da aplicação, no Acórdão recorrido, de disposições em violação da Lei Fundamental. § 33. É inevitável, face ao teor do Acórdão recorrido – que, naturalmente, não assume expressamente e ipsis verbis a norma que está a aplicar –, que a ora recorrente, para demonstrar a inconstitucionalidade da decisão a quo na parte em que rejeita a ausência de factos, tenha que apelar e citar a concreta factualidade imputada e provada, i.e., tenha que pôr em perspetiva as premissas sob as quais o Tribunal laborou e sob a qual perspetivou a norma que aplicou. § 34. Mas este exercício da recorrente, visando tão-só esclarecer o alcance do Acórdão recorrido, não contém em si qualquer pretensão de sindicância ou revisitação do caso concreto, outrossim a mera demonstração de que o Tribunal a quo acolheu uma decisão administrativa omissa. § 35. Conclui-se, pois, que há uma total idoneidade do objeto do recurso, por estar em causa a apreciação de uma (in)constitucionalidade normativa, razão pela qual se requer, desde logo, que os Exmos. Senhores Juízes Conselheiros conheçam do mérito da questão, tal como foi invocada pela recorrente. § 36. Advertiu, por fim, o Exmo. Senhor Juiz Conselheiro Relator que a questão de inconstitucionalidade ora em análise poderia vir a não ser conhecida por uma alegada violação do disposto no artigo 72.º, n.º 2, da LTC, na medida em que, nos termos desse artigo, a recorrente seria parte ilegítima. § 37. Também este pressuposto se encontra verificado: a questão de (in)constitucionalidade ora em análise foi suscitada pela recorrente no seu Recurso de Impugnação Judicial, datado de 31 de março de 2017, em especial no ponto 73. e na respetiva Conclusão M, e, bem assim, no seu Recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães (que proferiu o Acórdão recorrido), em especial no ponto 15. e na respetiva Conclusão § 15. § 38. O Acórdão recorrido aplicou os artigos 50.º e 58.º do RGCO no sentido de que a decisão final da fase administrativa em procedimento contraordenacional não carece de indicar os elementos de facto reconduzíveis à esfera de ação ou controlo do arguido que instanciam todos e cada um dos elementos objetivos do ilícito. [§§ 39.-59: conclusões quanto ao mérito] [Quanto à norma enunciada em III.1 do requerimento de recurso] § 60. O Acórdão recorrido interpretou e aplicou os artigos 50.º e 58.º do RGCO e 283.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, no sentido de que a decisão final da fase administrativa de processo de contraordenação não carece de identificar as pessoas singulares representantes da arguida responsável pela infração. § 61. O princípio da dignidade da pessoa humana (artigo 1.º da Constituição da República Portuguesa) traduz-se numa posição subjetiva, isto é, o direito dos cidadãos a não ser sujeitos a tratamento violador da sua dig- nidade, o que impõe a indicação a pessoa coletiva arguida das concretas pessoas singulares que atuaram, violando uma norma legal no seu nome e interesse i.e., a demonstração do substrato humano da infração. § 62. O Acórdão recorrido, ao validar a omissão dessa indicação, acaba por verdadeiramente nada imputar à arguida, que não tem como se defender de atos que nunca são descritos, desta forma se instrumentalizando a situação da arguida aos desígnios punitivos. § 63. Tal utilização de arguido, enquanto meio e não enquanto fim, é violadora do princípio da dignidade da pessoa humana, que impõe o tratamento da pessoa como um fim em si. § 64. O princípio do Estado de Direito democrático concretiza-se, também, em exigências de um Estado de Justiça. § 65. O apuramento e indicação dos concretos factos praticados por um agente – no que não pode deixar de incluir a indicação das pessoas singulares que atuaram sobre a realidade – que o fazem incorrer em medidas
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