TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018

491 acórdão n.º 566/18 da concessão de facilidades de utilização ou cedência de instalações, apoio técnico, financeiro ou material.» Ou seja, os atos ilícitos imputados à arguida, face ao tipo objetivo concretamente em causa, podem ser descritos na sua materialidade – como foram –, não sendo necessário à viabilização da defesa da arguida a indicação de todas e cada uma das pessoas singulares que tomaram parte nas diversas condutas correspon- dentes às modalidades de apoio consideradas. Desde logo, porque o domínio da arguida ora recorrente sobre a própria infraestrutura – in casu , o estádio –, incluindo o controlo das entradas no mesmo e o acesso a áreas reservadas, a colocação de painéis publicitários e o fornecimento de energia elétrica, constitui uma condição necessária das próprias condutas proibidas dadas como provadas nos autos – o apoio sob diversas formas aos GOA denominados (...) e (...) – por isso mesmo, tal domínio da arguida ora recorrente é também condição suficiente da imputação das mesmas condutas a si própria. A recorrente, em virtude do referido domínio, não pode deixar de as conhecer (e de as querer como suas). Deste modo, se o apoio aos GOA nas modalidades concretamente em causa só se verificou porque a recorrente quis apoiar tais grupos de adeptos, as pessoas singulares ao serviço da recorrente que intervieram na concretização desse apoio apenas executaram a vontade da própria recorrente. Consequentemente, a mesma recorrente também não está impossibilitada de discutir e de contraditar tais condutas. Este é um corolário da responsabilidade direta das pessoas coletivas consagrada no artigo 7.º, n.º 2, do RGCO: as condutas daqueles que agem em nome e por conta da pessoa coletiva vinculando-a – ou seja, daquelas pessoas ao serviço da pessoa coletiva cujas funções implicam uma posição de liderança – consti- tuem atos próprios da pessoa coletiva. Esta atua por via daquelas pessoas, de tal modo que as condutas de tais pessoas são tidas como condutas da própria pessoa coletiva. Daí que, para efeitos de responsabilidade, seja suficiente o conhecimento apenas daquelas condutas: a indicação da pessoa singular que praticou o facto correspondente à contraordenação é dispensável, a partir do momento em que tal facto é próprio da pessoa coletiva. A responsabilidade desta não depende prévia ou concomitantemente da responsabilidade das pes- soas singulares cujas condutas lhe são (direta e autonomamente) imputadas. Assim, e como se concluiu no citado Parecer n.º 11/2013 do Conselho Consultivo da Procuradoria- -Geral da República (vide p. 28823): a responsabilidade autónoma da pessoa coletiva implica a «possibili- dade de imputação da responsabilidade contraordenacional à pessoa coletiva desde que seja cometida uma infração tipificada como ilícita e que seja imputável a alguém que atue por conta ou em nome da pessoa jurídica (titulares dos seus órgãos, mandatários, representantes ou trabalhadores)». Acresce que, assentando o fundamento de tal responsabilidade na imputação de comportamentos de pessoas singulares funcional- mente ligadas à pessoa coletiva, aquelas não precisam de ser identificadas nem individualizadas (vide ibidem , a conclusão 5). No caso vertente, verifica-se que a pessoa coletiva detém um domínio sobre a totalidade dos factos ilícitos que lhe são imputados, e que os mesmos se encontram devidamente descritos quanto aos aspetos relevantes para tal imputação na decisão administrativa condenatória, em especial quanto à necessidade da colaboração de pessoas singulares que ocupam uma posição de liderança e no respeitante aos resultados de tal colaboração materializados nas diversas modalidades de apoio aos GOA. Deste modo, a omissão nessa deci- são da indicação das pessoas singulares que concretamente agiram em nome e por conta da pessoa coletiva não é impeditiva da imputação das condutas verificadas à própria pessoa coletiva e, por isso, também não é indispensável à garantia do respetivo direito de defesa, em especial, do seu direito ao contraditório. Importa, agora, avaliar a solvabilidade desta conclusão à luz dos parâmetros constitucionais concreta- mente invocados. 14. A referência à dignidade da pessoa humana e ao princípio do Estado de direito democrático nada acrescentam à aludida queixa de que a omissão da indicação na decisão administrativa das pessoas singulares que praticaram os atos concretizadores do ilícito correspondente à contraordenação cria para a arguida ora

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