TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018

497 acórdão n.º 582/18 fundamento normativo do aí decidido. Tal não ocorre, por exemplo, quando a decisão judicial utiliza argumenta- ção jus-constitucional como um simples obiter dictum , um argumento ad ostentationem , ou, de uma forma geral, quando não conduz a uma verdadeira desaplicação de uma norma. Ora, apesar de no requerimento de interposição de recurso apresentado pela Autoridade Tributária e Adua- neira, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, se qualificar o acórdão recorrido como sendo uma decisão de recusa de aplicação de norma com fundamento em inconstitucionalidade, tal não corres- ponde ao decidido. No enunciado formal do acórdão recorrido não se encontra a afirmação de tal recusa de aplicação com funda- mento em inconstitucionalidade. O acórdão recorrido pondera diversas vias interpretativas possíveis do conjunto de preceitos que engloba o artigo 7.º, n.º 1, alínea e) , do Código do Imposto do Selo e os artigos 152.º e 154.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, que aprovou o Orçamento do Estado para 2016, tomando em linha de conside- ração, entre outros, o critério da sua conformidade com a Constituição. Desse exercício interpretativo resulta, para o tribunal a quo, o afastamento das interpretações que redundam numa solução inconstitucional relativamente ao caso concreto. Nas palavras do tribunal a quo «a opção legislativa é totalmente legítima desde que vigore apenas e só para o futuro, aplicando-se apenas a factos tributários ocorridos após a entrada em vigor da nova lei. Outro enten- dimento seria permitir a violação ostensiva do princípio da não retroatividade fiscal expressa e inequivocamente consagrado na nossa Constituição» e «ao ser designada pelo legislador como interpretativa, a consequência desejada é a sua aplicação desde a vigência da norma interpretada. (…). Mas se assim se entendesse, a sua aplicação violaria, necessariamente, o princípio da não retroatividade da lei fiscal (…)» (cfr. n. os 36-37 da decisão arbitral, p. 30, fls. 32). Trata-se, portanto, do exercício da normal atividade interpretativa e subsuntiva dos tribunais comuns – de interpretação do Direito conforme à Constituição – e não a desaplicação de uma qualquer norma por inconstitu- cionalidade. Nesse caso não se encontra aberta a possibilidade de recorrer para o Tribunal Constitucional ao abrigo da alínea a) , do n.º 1, do artigo 70.º da LTC. O tribunal recorrido não procedeu, portanto, à efetiva desaplicação da alegada norma inconstitucional, não se cumprindo este requisito legal para a admissão do recurso.» 4. Inconformada, reclama agora da decisão sumária com a seguinte fundamentação (fls. 137-139): «(…) 8. Ressalvado o devido respeito, discordamos da asserção veiculada na Decisão Sumária, uma vez que a decisão arbitral não tomou em “linha de consideração, entre outros o critério da sua conformidade com a Consti- tuição” (itálico nosso). 9. A fundamentação subjacente à mesma centra-se, única e exclusivamente, em juízos de conformidade das disposições legais em causa com a Constituição. (…) 14. Ora, o itinerário percorrido pelo douto Tribunal Arbitral teve apenas um único propósito: a aferição da natureza interpretativa da norma invocada pela AT para promover a correção em análise, pois que, no o sendo, se estaria perante urna norma de natureza retroativa e por isso, inconstitucional. 15. E, nesta análise interpretativa promovida, a Tribunal concluiu que o n.º 7, do artigo 7.º do CIS, introdu- zido pelo artigo 153.º da Lei n.º 7-A/2016 de 30 de março é “verdadeiramente inovador”. 16. Pelo que, consequentemente, de acordo como raciocínio expendido, a decisão arbitral concluiu que as normas invocadas são de aplicação retroativa. 17. O que determina, no entender do Tribunal Arbitral, que as mesmas normas são ilegais por violação da lei e da Constituição, por violação do princípio da não retroatividade, previsto no n.º 3, do artigo 103.º da Consti- tuição. (…) 20. Pelo que, nos termos aduzidos no requerimento de recurso apresentado, que aqui se dão por integralmente reproduzidos, se conclui que estão verificados os requisitos para o Tribunal Constitucional conhecer do objeto do recurso.

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