TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
502 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL IV - O falecimento de uma das partes determina a suspensão da instância, mas não obsta ao decurso do prazo de deserção; o único facto capaz de impedir a deserção é a prática do ato tendente a fazer andar o processo; como a suspensão da instância deriva de um facto – a morte de uma das partes – com efeito suspensivo que dá lugar a um incidente processual que aos demandantes sobrevivos cabe impulsio- nar, se este ónus não for satisfeito no prazo de seis meses, a instância extingue-se, por isso, o que faz perimir a instância é a paralisação do processo por inércia ou inatividade das partes sobrevivas (ou dos sucessores da parte falecida) durante esse período. V - A compatibilidade da questão de constitucionalidade que o Tribunal é chamado a apreciar com o arti- go 20.º da Constituição, não convoca como parâmetro o princípio da proibição da indefesa, associado ao princípio do contraditório, porque não integra quaisquer elementos ou circunstâncias relacionadas com a oportunidade de defesa; envolve necessariamente dimensões do direito de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efetiva, pois na medida em que o processo, enquanto instrumento de realização do direito, não chega a alcançar o resultado desejado pelo direito material, pode dizer-se que a deser- ção da instância afeta o direito à tutela jurisdicional efetiva, do qual, em associação com a regra do processo equitativo, decorre um princípio de efetividade processual, segundo o qual o processo deve proporcionar às partes, quanto for possível, a realização concreta, real e efetiva do direito violado. VI - Não obstante a instância findar em consequência da deserção, inviabilizando a realização final da tute- la jurídica, daí não se pode concluir que tal cominação seja inidónea à realização dos fins do processo; além dos valores da eficiência e da economia, a efetividade processual compreende um fator temporal, que diz respeito ao tempo de tramitação da ação, a efetividade temporal do processo implica não só o direito a uma decisão em prazo razoável como também o uso pelo legislador de instrumentos de cele- ridade processual; ora a deserção da instância é um mecanismo que promove a celeridade processual, obstando à eternização do processo em tribunal, quando a parte se desinteressa da lide ou negligencia a sua atuação, não promovendo o andamento, quando lhe compete fazê-lo. VII - A extinção total da instância por deserção, nos casos de coligação ativa, não é incompatível com o princípio da proporcionalidade; em primeiro lugar, a deserção está prevista na lei para as situações em que o processo se encontra a aguardar impulso processual das partes há mais de seis meses, constituin- do a sanção pelo não cumprimento do ónus de diligência na condução do processo – deserção da ins- tância – uma manifestação do princípio da auto-responsabilidade das partes, que continua a vigorar no processo civil; em segundo lugar, a gravidade da extinção da instância pela paragem prolongada do processo é atenuada, quer pela exigência de “negligência das partes”, quer pelo reconhecimento ope judicis da deserção, tendo sempre as partes a possibilidade de demonstrar no processo que a paragem se deve a causas estranhas à sua vontade, sendo o comportamento omissivo das partes apreciado e valorado por ato do juiz, podendo a existência de um impedimento à satisfação do ónus de impulso processual afastar o juízo de negligência sobre a conduta das partes; em terceiro lugar, a deserção é uma ocorrência que extingue a instância, sem prejudicar o direito de ação e o direito material ou substan- cial em litígio, conservando o autor o direito de propor nova ação sobre o mesmo objeto, não se afi- gurando que a deserção da instância origine consequências processuais totalmente desproporcionadas à gravidade da falta de cumprimento do ónus de promoção pelos autores sobrevivos do incidente de habilitação dos sucessores dos autores falecidos. VIII - A norma impugnada não discrimina autores coligados de autores isolados, sendo a extinção da instância pela paralisação prolongada do processo uma consequência que tanto ocorre nas ações com um só autor
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=