TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018

507 acórdão n.º 604/18 VIII. A não apresentação de certidões dos assentos de óbito de Autores falecidos não pode fundamentar a extin- ção da instância (por deserção) para os Autores sobrevivos, pois o não cumprimento desse ónus de impulso processual deve repercutir-se apenas nas ações dos falecidos sem sucessores habilitados, extinguindo-as, man- tendo-se a instância quanto a todas os demais (artigo 351.º, n.º 1 do CPC). Se é verdade que a lei permite às partes sobrevivas habilitarem os sucessores da parte falecida, tal não constitui um dever ou uma obrigação que lhes imponha. A negligência processual não consiste numa omissão de um poder agir, mas sim na violação de um dever de agir e, neste caso, onerados com essa obrigação são os herdeiros da parte falecida, que perdem, não acatando esse ónus, o direito de prosseguir com a respetiva ação. IX. A norma extraída do disposto nos artigos 281.º, n. os 1 e 3, e 351.º, n.º 1, ambos do CPC, deve ser lida com o sentido de que, em caso de falecimento de um dos Autores em coligação ativa, o dever de impulso processual cabe aos herdeiros do falecido, pelo que a negligência processual destes determina, quanto à ação do Autor falecido, a extinção da instância, não afetando no entanto as ações dos demais Autores sobrevivos coligados. X. É flagrantemente inconstitucional a norma extraída dos artigos 281.º, n. os 1 e 3, e 351.º, n. º1 do CPC com o sentido de que, em caso de falecimento de um dos Autores em coligação ativa, recai sobre os Autores sobre- vivos o dever de impulso processual da habilitação dos seus herdeiros, determinando o não cumprimento desse ónus a extinção da instância quanto a todos os Autores e não apenas quanto à ação do que faleceu – pois ofende desde logo o princípio da tutela jurisdicional efetiva, contido no princípio do Estado de Direito democrático. XI. É manifestamente lacunosa a interpretação do acórdão recorrido que aplica como causa decidendi norma extraída dos arts. 281.º, n.º 1 e 3 e 351.º, n.º 1, do CPC com o sentido de que o óbito de um dos Autores coligados, logo que ultrapassado o prazo de seis meses sem que seja promovido incidente de habilitação dos respetivos herdeiros, impõe ao Juiz que decrete a extinção da instância quanto a todas as ações e não apenas quanto à proposta por quem faleceu. XII. A errada interpretação, pelo acórdão recorrido, dos artigos em causa, viola os princípios constitucionais: 1) Da tutela jurisdicional efetiva que a Constituição consagra nos artigos 2.º, 18.º n.º 1, e 20.º n.º 1 (que integra o princípio da proibição da indefesa, garantindo ao litigante o direito de obter do litígio uma solu- ção efetiva – e não apenas uma mera oportunidade formal de defesa destituída de substância ou sentido); 2) Da proteção da confiança – dimensão subjetiva do princípio da segurança jurídica, consagrado também no artigo 2.º do diploma fundamental –, na medida em que censura a omissão de atos processuais de habilitação a quem não tem ou pode não ter qualquer hipótese de os realizar e a quem seguramente não tem qualquer interesse em fazê-lo; 3) Da igualdade, consagrado no artigo 13.º da CRP, que postula um tratamento similar entre Autores coli- gados em demandas individuais conjuntas e Autores litigantes em demandas individuais isoladas – pois nada justifica que, numa coligação de ações, se reserve aos Autores sobrevivos, sempre que os herdeiros de um demandante falecido não se habilitem como seus sucessores, uma tutela dos respetivos direitos: (1) desigual da tutela reconhecida aos Autores isolados (em que só os seus sucessores têm o ónus de promover o andamento do processo) bem como (2) desigual da tutela de que beneficiariam caso tivessem proposto as respetivas ações individuais, isoladamente (caso em que o óbito de outro demandante em litígio, nou- tro processo, com demandado comum, por factos com o mesmo grau de diversidade e de similitude, lhes seria absolutamente alheio) – assim se concedendo portanto a uns e a outros tratamentos materialmente desiguais sem que nenhuma razão substancial ou divergência de situações de fundo o justifiquem; 3. Notificado para o efeito, o Ministério Público contra-alegou, concluindo da seguinte forma: 1.ª Recursos de constitucionalidade, interpostos pelos AA. (i) B. e (ii) A. e outros, com fundamento na alínea b) do n.º 1 do art. 70.º da LOFPTC, do Acórdão da Relação de Lisboa, de 22 de outubro de 2015, proferido no

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