TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
509 acórdão n.º 604/18 13.ª Nesta ordem de ideias, «para efetivação do direito de acesso à justiça, as normas processuais devem ser interpretadas e aplicadas no sentido de promover a emissão de pronúncias sobre o mérito das pretensões formula- das. Daí que o direito à tutela jurisdicional efetiva implique um processo equitativo, respeitador do “direito a um processo orientado para a justiça material sem demasiadas peias formalísticas” […]. Com efeito, “o princípio pro actione impede que simples obstáculos formais sejam transformados em pretextos para recusar uma resposta efetiva à pretensão formulada. A ideia do favor actionis aponta, outrossim, para a atenuação da natureza rígida e absoluta das regras processuais”». 14.ª A habilitação, prevista no n.º 1 do art. 351.º do CPC (habilitação-incidente), no quadro processual acima considerado, ao invés de formalidade obstaculizadora do efeito útil de decisão de mérito sobre a pretensão formu- lada, visa precisamente viabilizar a emissão desta. 15.ª Verificado o óbito de uma das partes, impossibilitada a instância de prosseguir, não sendo caso de inu- tilidade ou impossibilidade de continuação da lide, suspender-se-á até que se habilitem os sucessores do falecido [CPC, arts. 269.º, n.º 1, alínea a) , 270.º, n os . 1 e 2 e 276.º, n.º 1, alínea a) ]: «A habilitação destina-se em tal caso a colocar o sucessor ou sucessores do falecido no lugar que este ocupava no processo». 16.ª Faculta-se o prosseguimento com a modificação subjetiva da instância, ao abrigo do disposto na alínea a) do art. 262.º do CPC. 17.ª A deserção da instância, nos termos previstos nos n. os 1 e 3 do art. 281.º do CPC, com a consequente extinção da mesma [CPC, art, 277.º, alínea c) ], tem-se como efeito adequado à prolongada negligência das partes em impulsionar o processo, cujo ónus lhes incumbe – extingue-se a instância, não o direito à ação, o direito subs- tantivo que com ela se pretendia exercer. 18.ª Justificar-se-á presentemente o instituto da deserção, além de dirigido à boa gestão dos serviços judiciários, pela sua natureza instrumental em vista da tutela da celeridade processual. 19.ª A suscitada inconstitucionalidade dos arts. 281.º, n. os 1 e 3 e 351.º, n.º 1 do CPC (numeração atual) vem, como referido, restringida ao quadro da sua interpretação e aplicação no caso de coligação de autores, prevista no art. 36.º do mesmo código, para mais tratando-se no presente processo de «cerca de oitocentas ações de oitocentos Autores». 20.ª É certo, como alegam os recorrentes, que, através da coligação, facultada nos termos do art. 36.º do CPC (art.º 30.º do CPC de 1961), se verifica uma cumulação de ações, embora conexas, todas autónomas e indepen- dentes: com «a coligação, à pluralidade das partes corresponde a pluralidade das relações materiais litigadas». 21.ª A constituição da vasta coligação de Autores que esteve na base da presente lide, com a verificada multi- plicação de incidentes de habilitação, daquela consequente, foi pelos próprios determinada, precisamente lançando mão do mecanismo facultado pelo invocado art. 36.º do CPC (art.º 30.º do CPC de 1961), na livre definição da estratégia processual entendida por mais adequada. 22.ª Ao optarem por se apresentar coligados perante o Tribunal, os recorrentes vincularam-se à instrução, discussão e julgamento em conjunto das várias ações (sem prejuízo, em relação a eles próprios, de liberdade de atuação, designadamente quanto à liberdade de desistência, confissão e transação) e, em resultado da escolhida unificação processual, à disciplina dos arts. 281.º, n. os 1 e 3 e 351.º, n.º 1 do CPC, tal como acima examinada e aplicada pelo Acórdão da Relação – ubi commoda, ibi incommoda . 23.ª Não vem substantivamente alegado, nem do processo se descortina, que a promoção dos sucessores das partes falecidas implicava, no caso, para os recorrentes, a prática de atos de desrazoável ou de desadequada exigência de consecução, em vista ao prosseguimento do processo. 24.ª Relativamente aos novos fundamentos agora oferecidos na alegação do 1.º recorrente, antes não pro- cessualmente invocados (conclusão 3.ª), prevenindo a hipótese que deles, não obstante, se entenda conhecer no presente recurso: 25.ª A alegada violação do princípio da confiança é justificada pelo 1.º recorrente, nos seguintes termos: «na medida em que censura a omissão de atos processuais de habilitação a quem não tem ou pode não ter qualquer hipótese de os realizar e a quem seguramente não tem qualquer interesse em fazê-lo».
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