TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
511 acórdão n.º 604/18 O acórdão recorrido julgou improcedente o recurso jurisdicional do despacho que declarou deserta a instância por ter decorrido o prazo de seis meses previsto no n.º 1 do artigo 281.º do CPC, «sem impulso processual dos AA. no que se reporta à junção das certidões de óbito ainda em falta e habilitação dos her- deiros dos falecidos – conforme despachos proferidos em 13 de janeiro de 2014 e 17 de março de 2014». No recurso que interpuseram para a Relação, os recorrentes defenderam que a norma extraída dos artigos 281.º, n. os 2 e 3, e 351.º, n.º 1, do CPC deve ser lida no sentido de que, em caso de falecimento de um dos autores em coligação ativa, o dever de impulso processual cabe aos herdeiros do falecido, pelo que a negligência processual destes determina a extinção da instância quanto ao pedido do autor falecido, não afetando a mesma quanto aos demais autores coligados. No seu entendimento, a negligência processual não consiste numa simples omissão de um poder-agir, mas na violação de um dever de agir, e em caso de coligação ativa, o único sujeito processual onerado com essa obrigação é o conjunto dos herdeiros da parte falecida que, sem se encontrarem habilitados, perdem o direito de prosseguir os termos da ação. Por isso, é inconstitucional a norma extraída desses preceitos, com o sentido de que, em caso de falecimento de um dos autores em coligação ativa, recai sobre os autores sobrevivos o dever de impulso processual do incidente de habilitação de herdeiros, por forma a que o não cumprimento desse ónus determine a extinção da instância quanto a todos os autores e não unicamente quanto ao pedido formulado pelo autor falecido. O acórdão recorrido considerou que tal interpretação não respeita a unidade do sistema jurídico e não tem um mínimo de correspondência verbal na letra dos preceitos invocados; aceitar a tese dos apelantes é contender com a lógica do sistema, pois permite considerar que, falecida uma das partes, a instância se suspende apenas relativamente a ela, prosseguindo com as partes sobrevivas; por outro lado, se o legislador quisesse a solução preconizada pelos apelantes não legitimaria tanto as partes que sobrevivem como qualquer sucessor da parte falecida a promoverem a habilitação; é já pensando no desinteresse dos sucessores da parte falecida que o legislador concede às partes sobrevivas a legitimidade para promoverem a habilitação, para que cesse a suspensão e o processo prossiga. Considerando que o recurso de constitucionalidade, reportado a determinada interpretação normativa, tem que incidir sobre o critério normativo que subjaz à decisão recorrida, impõe-se, antes de mais, algumas observações prévias sobre a delimitação do objeto do recurso. Em primeiro lugar, a interpretação normativa identificada como objeto do recurso é a que vem enun- ciada no requerimento de interposição do recurso e não nas respetivas alegações. Como reiteradamente vem julgando a jurisprudência constitucional, é nesse requerimento que os recorrentes delimitam, em termos irremediáveis e definitivos, o objeto do recurso, não lhes sendo consentida qualquer modificação ulterior, nomeadamente no âmbito das alegações (Acórdãos n. os 286/00, 146/06, 293/07 e 3/09). Assim, a interpreta- ção normativa que pretendem submeter ao Tribunal Constitucional assenta apenas na conjugação dos artigos 281.º, n.º 1, e 351.º, n.º 1, não relevando o n.º 3 do artigo 281.º, que apenas foi acrescentado ao objeto do recurso nas alegações dos recorrentes. Em segundo lugar, o fundamento jurídico determinante da deserção da instância declarada pelo tribu- nal “a quo” foi a paragem do processo por mais de seis meses causada por duas condutas omissivas das partes: (i) falta de junção das certidões de óbito ainda em falta; (ii) não promoção do incidente de habilitação dos herdeiros dos autores falecidos. A primeira, não cumpriu o dever processual previsto no n.º 2 do artigo 270.º do CPC para o «comparte ou parte contrária» da parte falecida; a segunda, não satisfez o ónus processual (e/ ou a faculdade) imposto no n.º 1 do artigo 351.º do CPC a «qualquer das partes que sobreviveram ou qual- quer dos sucessores». Ora, a interpretação normativa definida no requerimento de interposição do recurso assenta no “arco legislativo” formado pelos artigos 351.º, n.º 1, e 281.º, n.º 1, do CPC, e portanto, apenas a paragem do processo causada pela falta de promoção do incidente de habilitação herdeiros integra a dimen- são normativa impugnada. Por isso, a paragem do processo por incumprimento do dever de providenciar pela junção do documento comprovativo do falecimento de qualquer das partes, a que se refere o n.º 2 do artigo 270.º, não está incluída no objeto do recurso.
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