TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018

512 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Em terceiro lugar, a interpretação normativa questionada reporta-se exclusivamente às situações em que a lei processual admite a coligação de autores. A deserção da instância foi declarada numa ação proposta por vários autores coligados contra o mesmo réu, que esteve parada por mais de seis meses sem que tivesse sido requerida a habilitação dos sucessores dos autores falecidos. Portanto, a interpretação judicial dos preceitos indicados pelos recorrentes – artigos 281.º, n.º 1, e 351.º, n.º 1, do CPC – apenas é questionada sob o prisma da constitucionalidade quando aplicada às ações com pluralidade de autores, na forma de coligação voluntária, nos termos em que tal cumulação subjetiva é admitida nos artigos 36.º e 37.º do CPC. Por último, o modo como os recorrentes delimitam a interpretação normativa impugnada parece excluir do objeto do recurso a constitucionalidade do ónus processual imposto no n.º 1 do artigo 351.º do CPC a «qualquer das partes que sobreviverem». De facto, a formulação que fazem dessa interpretação incide mais sobre a sanção que resulta da paragem do processo pela não dedução, em tempo devido, do incidente de habilitação de herdeiros do que sobre o ónus de promoção desse incidente.  Todavia, não obstante a dimensão formal que a interpretação normativa deve assumir para consti- tuir objeto idóneo de um recurso de fiscalização concreta, é de admitir que a interpretação normativa cuja constitucionalidade pretendem sindicar tenha que incidir também sobre a imposição aos autores coligados sobrevivos do ónus de impulso processual do incidente de habilitação de herdeiros. Na verdade, foi nesse sentido que os recorrentes colocaram a questão de constitucionalidade no recurso jurisdicional (n.º XI das conclusões) e no recurso de constitucionalidade (n.º X das conclusões das alegações), assim como foi esse o critério normativo que constituiu ratio decidendi do acórdão recorrido. Como a sanção – extinção da instân- cia por deserção – resulta somente de não se ter por verificada a situação que se produziria se o ónus fosse cumprido – habilitação por sucessão, com o consequente prosseguimento da ação – a interpretação norma- tiva sindicada pressupõe necessariamente que sobre os autores sobrevivos recai o ónus de impulso processual. Os recorrentes consideram que o resultado da interpretação judicial dos preceitos jurídicos aplicados pelo acórdão recorrido – artigos 281.º, n. os 1, e 351.º, n.º 1, do CPC – é inconstitucional por violação (i) do princípio da tutela jurisdicional efetiva, enunciado no artigo 20.º, n. os  1 e 5, da Constituição (CRP); (ii) do princípio da confiança, ínsito no artigo 2.º da CRP; (iii) e do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da CRP. Vejamos, em primeiro lugar, a solução imposta pelo direito processual civil para o caso de falecimento das partes no decurso da ação. Do mérito do recurso 5. O falecimento de uma das partes na pendência da causa repercute-se necessariamente no desenvol- vimento da ação: a instância só pode prosseguir com os respetivos sucessores se estes forem habilitados. É o que resulta das disposições conjugadas dos artigos 262.º, alínea a) , 269.º, n.º 1, alínea a) , 270.º, 276.º, n.º 1, alínea a) , e 351.º do CPC. Ressalvados casos particulares, o falecimento de uma das partes (ou extinção de pessoa coletiva), não dá lugar, direta ou indiretamente, à extinção ou limitação da instância. Em tal eventualidade, estranha à vontade das partes, cessa um dos pressupostos processuais essenciais à propositura da ação e à defesa do réu – a per- sonalidade judiciária –, o que impede o desenvolvimento da instância, pela impossibilidade de se praticarem atos processuais perante a parte falecida ou extinta. Não há, porém, impossibilidade de se declarar, por ato jurisdicional, o direito controvertido, porque no lugar que o falecido ocupava no processo pode ser colocado o seu sucessor ou sucessores. Há, pois, que se proceder à regularização da instância através do incidente de habilitação dos sucessores da parte falecida ou extinta. A lei pretende que o processo não continue nem finde sem que se dê a habilitação. Daí que a possibilidade de modificação subjetiva da instância em consequência da substituição de alguma das partes, por sucessão, constitua uma ressalva ao princípio da estabilidade da instância, expressamente consagrada no artigo 260.º do CPC.

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