TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018

52 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Foi precisamente a presença deste elemento no regime legal − a contabilização de rendimentos e patri- mónio do agregado familiar na determinação do montante da subvenção – que veio quebrar, no entender do Tribunal, a conexão da subvenção com o exercício da função ou cargo político. Escreveu-se no Acórdão n.º 3/16: «A causa determinante do problema que nos ocupa radica precisamente na circunstância de o legislador ter mandado aplicar às subvenções vitalícias regras concebidas para prestações destinadas a fazer face a situações de carência, em que a condição de recursos faz todo o sentido. Ao determinar a aplicação de tais regras às subvenções vitalícias – que não têm, nem nunca tiveram, tal finalidade –, desvirtuaram-se inevitavelmente estas. Como se disse noutro ponto, estas subvenções, quando foram instituídas, apresentavam quatro características principais: eram vitalícias; apenas estavam condicionadas a um requisito positivo de atribuição; tinham natureza não contributiva; e o seu fundamento único residia na atividade exercida pessoalmente pelo beneficiário, prescin- dindo de quaisquer condicionantes relativas à situação civil, familiar ou outra, daquele. Ora, a contabilização de outros rendimentos do beneficiário e do seu agregado familiar constitui um elemento inovador no regime jurídico relativo a estas prestações, que as descaracteriza por completo. Com a nova configura- ção, constante das normas sob escrutínio, a subvenção mensal vitalícia perde a sua natureza de benefício atribuído aos ex-titulares de cargos políticos, em razão dos serviços prestados ao país e tendo em conta as especiais exigências e potenciais consequências, nos percursos de vida de cada um, do desempenho de determinadas funções, e passa a revestir a natureza de prestação não contributiva comum, visando, como as outras, tão-somente evitar que os seus beneficiários sofram uma situação de carência económica.» Este trecho revela claramente que determinante para o juízo de inconstitucionalidade da norma do artigo 80.º foi o entendimento de que a sujeição das subvenções à condição de recursos definida no Decreto- -Lei n.º 70/2010 – não a uma qualquer condição de recursos, mas a esta em particular, pelo facto de implicar a contabilização de rendimentos e património do agregado familiar do beneficiário – era o elemento radi- calmente novo que adulterava a natureza da subvenção. Conforme se salientou na decisão, a propriedade básica e constante da subvenção mensal vitalícia encontrava-se em «o seu fundamento único resid[ir] na ati- vidade exercida pessoalmente pelo beneficiário, prescindindo, por isso, de quaisquer condicionantes relativas à situação civil, familiar ou outra, daquele». Por aqui passava a linha divisória da subvenção relativamente a qualquer outra prestação não contributiva: enquanto aquela, recompensando o empenho e compensando os sacrifícios do serviço público, se encontrava exclusivamente dependente da situação económica do bene- ficiário, nomeadamente dos seus rendimentos, estas, tendo por razão de ser assegurar mínimos de existência condigna, garantindo apenas a sobrevivência, incluíam na sua contabilização fatores relativos à situação económica, não apenas do beneficiário, mas também do seu agregado familiar. Como resulta inequivocamente da comparação entre a norma do artigo 80.º e as normas objeto do presente processo, em momento algum estas determinam ou impõem a contabilização, para efeitos de deter- minação do montante da subvenção mensal vitalícia, de rendimentos do agregado familiar. Na verdade, e como se disse, as normas dos n. os 7 e 8 do artigo 9.º da Lei n.º 52-A/2005 impõem a redução do valor da subvenção mensal vitalícia em razão aritmética direta dos rendimentos auferidos pelo beneficiário da subvenção no exercício de atividade privada, sempre que tal remuneração supere o limiar de três vezes o indexante de apoios sociais. A sujeição do montante da subvenção a atribuir ao rendimento derivado do exercício de atividades privadas cinge-se ao universo de vida do próprio beneficiário. Ora, se o montante a ser recebido pelo beneficiário não depende, em nenhuma medida, de outros rendimentos que não os auferidos pelo próprio, não se vislumbra onde possa ocorrer «postergação da pessoalidade que denota a essência do instituto»; pelo contrário, a conclusão a extrair é a de que as normas sindicadas não adulteram a natureza da figura. Nestes termos − e conforme se sublinhou Acórdão n.º 3/16 −, considerando que, nas sucessivas alte- rações que fez ao regime das subvenções, o legislador evidenciou a intenção de reduzir o seu montante,

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