TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
56 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL é inerente à regulação da prescrição tributária, porquanto a definição de eventos que parem a respetiva contagem impede a atuação daquela garantia dos contribuintes; nestes termos, a disciplina da pres- crição das dívidas tributárias (e, especificamente, as suas causas de suspensão) compreende-se neces- sariamente no âmbito da reserva de competência legislativa da Assembleia da República, pelo que o Governo apenas pode regular tal matéria se devidamente autorizado para o efeito. IV - A tese segundo a qual a autorização legislativa contida na Lei n.º 39/2003, de 22 de agosto, para o Governo atuar no domínio do direito falimentar implica o poder de legislar sobre a prescrição de todas as dívidas do insolvente (e, por isso, também tributárias) não tem fundamento quando o respon- sável tributário não é o insolvente e está fora do processo de insolvência; a declaração de insolvência do devedor principal não impede os credores de prosseguirem a execução contra outros executados, pelo que a tese em análise, aplicada ao responsável subsidiário, implica a limitação de uma das suas garantias fiscais, que, irradiando para fora do processo de insolvência, não é necessária à universalidade da ação falimentar. V - Do ponto de vista do responsável subsidiário, a norma em crise cria uma nova causa de suspensão da prescrição (a insolvência de outrem), declarada em processo em que este não é parte e sem que o Governo haja sido para tal autorizado; não se encontra na Lei n.º 39/2003, de 22 de agosto, qualquer credencial para determinar a suspensão de dívidas tributárias exigidas a sujeitos que não estão no processo de insolvência; independentemente da questão de saber se o autorizado regime falimentar implica a suspensão das dívidas fiscais exigidas ao insolvente, não existe habilitação suficiente para afetar as garantias dos responsáveis subsidiários. VI - Quanto ao argumento de acordo com o qual a necessária habilitação constaria da alínea a) do n.º 3 do artigo 1.º da Lei n.º 39/2003, de 22 de agosto, uma vez que a mesma legitima o Governo a legislar sobre as “consequências decorrentes do processo especial de insolvência para o Estado e a capacidade do insolvente ou seus administradores” e a definição do sentido e extensão das alterações a introduzir seria depois, de acordo com o n.º 5 do mesmo artigo 1.º, especificado nos artigos subsequentes; nada se encontra na disposição correspondente à definição do sentido e extensão das alterações a legislar pelo Governo em matéria de “consequências decorrentes do processo especial de insolvência para o Estado e a capacidade do insolvente ou seus administradores” – artigo 2.º – quanto à matéria relativa às consequências decorrentes do processo especial de insolvência para o Estado. VII - A Lei n.º 39/2003, de 22 de agosto, nomeadamente o seu artigo 1.º, n.º 3, alínea a) , não habilita o Governo a determinar a suspensão da prescrição das dívidas tributárias imputáveis ao devedor subsi- diário por força da declaração de insolvência do devedor principal; assim, a norma extraída do artigo 100.º do CIRE, segundo a qual a declaração de insolvência suspende o prazo de prescrição das dívidas tributárias imputáveis ao devedor subsidiário no âmbito do processo tributário, enferma de inconsti- tucionalidade orgânica, uma vez que, sendo imputável ao Governo, e respeitando a matéria de reserva relativa da Assembleia da Republica nos termos do artigo 165.º, n.º 1, alínea i) , da Constituição, a sua edição não foi autorizada por esta mesma Assembleia.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=