TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
572 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL A encerrar este enquadramento jurisprudencial não será despiciendo assinalar, por último, que a exi- gência de proporcionalidade em matéria de custas judiciais foi também afirmada pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, no seu acórdão de 16 de novembro de 2010, proferido no caso Perdigão v. Portugal (Queixa n.º 24768/06), onde se concluiu que (itálico aditado): «39. Não compete ao Tribunal examinar, em geral, o sistema português relativo à determinação e fixação das custas judiciais. Todavia, neste caso, a aplicação desse sistema conduziu a uma total ausência de indemnização dos requerentes pela privação da propriedade que impugnaram. Nestas circunstâncias, tal situação fez impender sobre os requerentes um ónus excessivo que rompeu o justo equilíbrio que deve reinar entre o interesse geral da comunidade e os interesses fundamentais do indivíduo.» C) Do mérito 15. É objeto de fiscalização a norma que impõe a obrigatoriedade de pagamento do remanescente da taxa de justiça ao réu que venceu totalmente o processo e que não lhe deu azo, obrigando-o a pedir o mon- tante que pagou em sede de custas de parte, prevista no artigo 14.º, n.º 9, do RCP. A sentença recorrida questiona a proporcionalidade desta exigência do pagamento, fazendo notar que «se ambas as partes têm de pagar o remanescente no final do processo, qual a razão então para diferir o pagamento?». 16. A Constituição não consagra um direito de acesso ao direito e aos tribunais gratuito ou tendencial- mente gratuito, mas apenas assegura que a ninguém pode ser negado tal acesso por insuficiência de meios económicos. O n.º 1 do artigo 20.º da Constituição – «a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tri- bunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos» –, como resulta da jurisprudência do Tribunal Constitucional e é também, de há muito, salientado na doutrina (vide Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da Repú- blica Portuguesa Anotada, vol. I, 4.ª edição revista, Coimbra Editora, 2007, anotação ao artigo 20.º, n.º VI, e Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, tomo I, Coimbra Editora, 2005, anotação ao artigo 20.º, n.º VI), constitui uma garantia com dimensão prestacional que encontra o seu limite objetivo precisamente nos custos económicos que vão implicados na administração da justiça. É, assim, legítimo, que o legislador encontre um equilíbrio entre a responsabilidade individual dos sujeitos processuais e a respon- sabilidade coletiva da comunidade pelo pagamento desses encargos. No entanto, esse espaço de liberdade do legislador tem como limite a ideia de equivalência nos encargos, bem como o princípio da proporcionalidade na atuação geral do legislador (decorrente do princípio do Estado de direito, previsto no artigo 2.º), em especial relativamente à restrição do direito fundamental de acesso à justiça que está contida na exigência de uma taxa de justiça (artigos 18.º e 20.º da Constituição). É neste contexto, que importa aferir se é conforme ao princípio constitucional da proporcionalidade a exigência de pagamento do remanescente da taxa de justiça a quem é réu que por ser absolvido do pedido venceu totalmente a ação civil que contra si foi interposta, e por isso não foi condenado em custas, obri- gando-o a pedir o reembolso daquele montante em sede de custas de parte. 17. O princípio da proporcionalidade ocupa um lugar central no nosso ordenamento jurídico-constitu- cional, no que diz respeito ao controlo dos atos do poder público, nomeadamente como limite à liberdade de conformação do legislador, onde se inclui o estabelecimento da taxa de justiça. O ponto de partida da análise é a identificação do interesse público prosseguido pela solução legislativa em apreciação. A solução legislativa adotada no artigo 14.º, n.º 9, do RCP, foi introduzida pela Lei n.º 7/2012. Apesar de a exposição de motivos da iniciativa que esteve na sua base, a Proposta de Lei n.º 29/XII (1.ª), publi- cada no Diário da Assembleia da República , II Série-A, n.º 54, de 26 de outubro de 2011, e de os debates
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