TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
601 acórdão n.º 636/18 de sócios sob a convicção de que não seriam, identicamente, chamados a responder pelas dívidas sociais; as regras que definem o modelo de responsabilização e governação das sociedades de respon- sabilidade limitada não viabilizariam, à partida, que os correspondentes sócios pudessem ser respon- sabilizados, ainda que subsidiariamente, pelo passivo da pessoa coletiva, isto mesmo no âmbito da dissolução e liquidação, pois o respetivo regime incorpora a disciplina da responsabilidade dos sócios perante os credores própria de cada tipo societário. VII - O critério normativo recusado pelo tribunal a quo conduz a uma irrestrita responsabilização dos sócios de sociedade declarada extinta pela pena de multa decorrente da prática de ilícito penal tributário, operando a responsabilidade subsidiária estatuída pelo legislador tributário na interpretação normati- va sindicada, com total abstração da eventual responsabilidade pessoal do associado e sem que sobre este recaia um juízo autónomo de responsabilização, orientado por critérios de decisão próprios (dis- tintos dos que regulam a responsabilidade penal) e radicado na censura específica do desrespeito de deveres fiduciários daquele para com o património comum e a satisfação de interesses públicos. VIII - O sentido normativo em apreço comporta uma imputação de responsabilidade assente no próprio facto típico que é caracterizado com infração penal tributária, agora dirigida a todos os associados de sociedade comercial extinta com o encerramento da respetiva liquidação, nos termos do n.º 2 do artigo 160.º do Código das Sociedades Comerciais, mecanismo votado apenas a obviar os riscos de incapacidade do pagamento de multa; trata-se de regime legal votado apenas, ou primacialmente, à salvaguarda do programa punitivo, por meio da incidência sobre pessoa ou pessoas diferentes do agente as consequências jurídicas de natureza pecuniária decorrentes do facto típico; o legislador prescinde de qualquer exigência dirigida aos associados, a acrescer a essa simples condição, dispensan- do a averiguação e demonstração de uma qualquer ingerência ou interferência dos mesmos no trato comercial e tributário da sociedade, convivendo mesmo com o respetivo alheamento total das decisões que definam e moldem a vontade da pessoa coletiva condenada; do que se trata é de uma extensão da responsabilidade penal do ente coletivo aos associados. IX - Sendo certo que a responsabilidade dos associados acolhida no n.º 5 do artigo 7.º do RGIT se exerce subsidariamente ao chamamento do substrato patrimonial comum da entidade coletiva, pressupondo a verificação da inexistência ou a insuficiência deste para satisfazer o pagamento da sanção penal, não é menos certo que o critério normativo de decisão obtido por mediação interpretativa e em questão no presente recurso não comporta a concorrência de patrimónios autonomamente imputáveis, pressuposta na responsabilidade subsidiária; a (eventual) pena de multa imposta a uma sociedade extinta nessas condições constitui, na realidade das coisas, a condenação de uma concha vazia, cujas consequências jurídicas irão recair, inexoravelmente, sobre o património dos associados; e, o que se mostra decisivo, tais consequências de índole patrimonial prescindem de uma qualquer culpa em matéria de gestão da socie- dade, não acrescentando qualquer requisito adicional que possa subjazer à responsabilização dos associa- dos para além da simples assunção de tal qualidade; não se perfila, uma complementar responsabilidade subsidiária daqueles que exerçam funções de gestão ou administração da entidade sem personalidade jurídica, conquanto lhes seja subjetivamente imputável a falta de pagamento da pena de multa. X - Por assim ser, o regime de responsabilização inscrito na dimensão normativa aproveita essa mesma qualidade de sócio para impor a terceiro a responsabilidade penal exigida à pessoa coletiva, o que envolve, necessariamente, uma transmissão da responsabilidade penal, em infração do artigo 30.º, n.º 3, da Constituição.
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