TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018

606 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL fazendo correr sobre o património de cada associado a responsabilidade pelo cumprimento da pena de multa que vier a ser aplicada. Do mérito do recurso 5. A interpretação normativa em análise inscreve-se ao regime de responsabilidade das pessoas coletivas e equiparadas, contido no artigo 7.º do RGIT. A sua redação é a seguinte: «Artigo 7.º Responsabilidade das pessoas coletivas e equiparadas 1. As pessoas coletivas, sociedades, ainda que irregularmente constituídas, e outras entidades fiscalmente equi- paradas são responsáveis pelas infrações previstas na presente lei quando cometidas pelos seus órgãos ou represen- tantes, em seu nome e no interesse coletivo. 2. A responsabilidade das pessoas coletivas, sociedades, ainda que irregularmente constituídas, e outras enti- dades fiscalmente equiparadas é excluída quando o agente tiver atuado contra ordens ou instruções expressas de quem de direito. 3. A responsabilidade criminal das entidades referidas no n.º 1 não exclui a responsabilidade individual dos respetivos agentes. 4. A responsabilidade contraordenacional das entidades referidas no n.º 1 exclui a responsabilidade individual dos respetivos agentes. 5. Se a multa ou coima for aplicada a uma entidade sem personalidade jurídica responde por ela o património comum e, na sua falta ou insuficiência, solidariamente, o património de cada um dos associados.» A referida disposição acolhe a possibilidade de efetivação da responsabilidade de entes coletivos no quadro das infrações tributárias, um dos primeiros domínios criminais onde o legislador afastou o princípio societas delinquere non potest , quebra de paradigma justificada por exigências pragmáticas de política criminal. Na expressão de Figueiredo Dias, «[p]rovindo hoje as mais graves e frequentes ofensas aos valores protegidos pelo Direito Penal secundário, em muitos âmbitos, não de pessoas individuais mas coletivas, a irresponsabili- dade direta destas sempre significaria um seu inexplicável tratamento privilegiado perante aquelas» (in “Para Uma Dogmática do Direito Penal Secundário, Um Contributo para a Reforma do Direito Penal Económico e Social Português”, in Revista de Legislação e de Jurisprudência , ano 116.º, 1983-1984, p. 263). Recorde-se que o Tribunal teve oportunidade de apreciar legitimidade constitucional de uma tal responsabilização, com referência à (precursora) norma do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de janeiro, concluindo por juízo negativo de inconstitucionalidade (Acórdãos n. os  212/95 e 213/95). Anote-se ainda que o paulatino abandono do princípio societas delinquere non potest , sentido inicialmente no direito penal secundário, per- passa hoje o próprio direito penal primário ou clássico, sobretudo a partir da revisão do ordenamento penal operada pela Lei n.º 59/2007, de 4 de setembro, que trouxe consigo, com a nova modelação do artigo 11.º do Código Penal, a possibilidade de efetivação da responsabilidade penal dos entes coletivos em face de um extenso catálogo de crimes, incluindo, no respetivo n.º 11, norma com enunciado similar ao que consta do n.º 5 do artigo 7.º do RGIT (sobre a relação entre os preceitos, Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código Penal , 3.ª edição, Universidade Católica Editora, 2015, p. 140 [20]). 6. Com relevo para a questão em análise, importa referir que o RGIT prosseguiu, na matéria, a solução normativa já constante do diploma que substituiu – o Regime Jurídico das Infrações Fiscais Não Aduaneiras (RJIFNA), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 20-A/90, de 15 de janeiro, mormente o respetivo artigo 7.º. Toda- via, ao operar a delimitação do círculo de sujeitos visados por tal responsabilização, o legislador do RGIT foi mais específico: se o sentido lato do conceito de pessoa coletiva, constante do artigo 7.º do RJIFNA, abrangia

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=