TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
607 acórdão n.º 636/18 já as sociedades comerciais e as sociedades civis sob a forma comercial – pois ambas se acham dotadas de personalidade jurídica – o RGIT passou a autonomizar na previsão dos n. os 1 e 2 do respetivo artigo 7.º, todas as sociedades, ao mesmo tempo que se equiparam às sociedades regularmente constituídas as sociedades irregulares para efeitos de responsabilidade criminal (e contraordenacional). Cuidou-se, desse modo, de acautelar a natureza específica da personalidade tributária, que apenas depende da suscetibilidade de se ser sujeito de relações jurídicas tributárias (artigo 15.º da Lei Geral Tribu- tária), e que abrange igualmente múltiplos entes de facto, porquanto titulares de rendimentos tributáveis e/ ou vinculadas a uma prestação tributária de qualquer tipo, mas a que o direito não reconhece, fora desse âmbito, pela sua natureza ou vicissitudes de constituição, personalidade jurídica em geral. São disso exemplo as sociedades civis não constituídas sob a forma comercial, as sociedades comerciais ou civis sob a forma comercial, antes do registo, as mesmas bem como outras pessoas coletivas após a declaração da sua invali- dade, as associações sem personalidade jurídica (artigo 195.º do Código Civil), as comissões especiais (artigo 199.º do Código Civil) e os patrimónios autónomos, como a herança jacente (cfr. Jorge de Sousa e Manuel Simas Santos, Regime Geral das Infrações Tributárias anotado , 3.ª edição, 2008, p. 89). Centrando a atenção nos entes societários de índole comercial desprovidos de personalidade jurídica geral – aqueles que relevam para o presente recurso -, verifica-se que o RGIT visa especialmente as sociedades com atividade antes da celebração de escritura pública, seja com a criação de falsa aparência de que existe um contrato de sociedade, seja com a efetiva celebração de acordo de constituição, nos termos do artigo 36.º, n. os 1 e 2, do CSC, e as sociedades com celebração de escritura pública mas com atividade antes do registo, referidas no artigo 37.º, n.º 1, do CSC (nesse sentido, Gonçalo de Melo Bandeira, «Responsabilidade» Penal Económica e Fiscal dos Entes Coletivos – À Volta das Sociedades Comerciais e Sociedades Civis sob a Forma Comercial , Almedina, p. 351). Em tais os casos, o ente societário, porque dotado de organização e autorreferencialidade suficientes, pese embora a não perfeição da sua constituição e/ou registo, é elevado pelo legislador a centro autónomo de imputação de normas jurídico-tributárias, incluindo normas jurídico-penais. Com efeito, nos termos do 18.º, n.º 3, da Lei Geral Tributária, para além das pessoas singulares ou coletivas, também os patrimónios autónomos ou as organizações de facto ou de direito que, nos termos da lei, estão vinculados ao cumpri- mento da prestação tributária, como contribuinte direto, substituto ou responsável, assumem a condição de sujeitos passivos tributários. 7. Afirmada a responsabilidade criminal tributária das sociedades, independentemente da forma e regu- laridade da respetiva constituição, emerge, quanto aos entes societários carecidos de personalidade jurídica, o problema de saber, em caso de condenação em sanção de natureza pecuniária, qual o património onerado com a responsabilidade pelo respetivo pagamento. Na verdade, enquanto relativamente às sociedades regu- larmente constituídas, se encontra, nos termos gerais, assegurada a existência de um património societário, cuja gestão é autonomamente assegurada nos termos da orgânica societária, e sobre o qual incide a respon- sabilidade pelo passivo da pessoa coletiva, o mesmo não acontece no caso das sociedades desprovidas de personalidade jurídica. Estas, justamente por agirem à margem das formas e regimes societários legalmente previstos, revestem estruturas e modos de atuar muito diversos, podendo mesmo praticar atos de comércio ou outros tributariamente relevantes sem que sejam dotadas de um qualquer substrato patrimonial comum ou com património próprio muito reduzido e facilmente confundível com o património dos associados. O n.º 5 do artigo 7.º do RGIT procura justamente dar resposta a esse problema. Perspetivando tais situações, estipulou o legislador que, em caso de condenação do ente por crime tributário, existindo patri- mónio comum (por exemplo, nos casos, não infrequentes, em que, antes da celebração do contrato de socie- dade, os associados iniciam uma atividade tendencialmente estável e duradoura), deve este responder pelo pagamento da sanção pecuniária. Já quando não exista património comum, ou se revele insuficiente para o pagamento da sanção imposta (ou da parte remanescente, após o chamamento do património comum),
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