TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
609 acórdão n.º 636/18 estatuída pelo legislador tributário, o facto extintivo impõe que a responsabilidade pelo pagamento da multa criminal venha a recair sobre o património de cada um dos sócios, para, de seguida, recusar a aplicação de um tal critério normativo de criação jurisprudencial por contrariar o princípio da intransmissibilidade da responsabilidade criminal, acolhido no n.º 3 do artigo 30.º da Constituição. 9. Mostra-se, então, necessário equacionar os regimes de constituição, dissolução e liquidação das socie- dades comerciais, na vertente da responsabilização do património dos sócios. A constituição de uma sociedade tem no seu cerne a criação de uma estrutura coletiva dotada de auto- nomia e que vai atuar como sujeito de direitos e deveres próprios e centro próprio de imputação de normas jurídicas, dispondo de património próprio que responde, preferencial ou mesmo exclusivamente, pelas suas dívidas. Como refere o artigo 5.º do Código das Sociedades Comerciais, as sociedades “gozam de personalidade jurídica e existem como tais a partir da data do registo definitivo do contrato pelo qual se constituem”. É, pois, a aquisição da personalidade jurídica que permite afirmar a autonomia a interceder entre a sociedade e os correspondentes sócios. O referido registo obriga, nesta senda e como refere Coutinho de Abreu (in Curso de Direito Comercial, Volume II – Das Sociedades, Almedina, 2002, p. 165), a que: «Enquanto unitários sujeitos de direitos e deveres, elas têm nome (firma ou denominação), sede, autonomia patrimonial (os elementos patrimoniais ativos das pessoas coletivas respondem apenas pelas dívidas delas, ape- nas eles respondendo em certos casos – autonomia patrimonial perfeita –, respondendo também o património dos respetivos membros em outros casos – autonomia patrimonial imperfeita), órgãos, capacidade de gozo e de exercício de direitos; são as sociedades-pessoas as titulares dos correspondentes patrimónios sociais, não os sócios, titulares, isso sim, de «participações sociais», geneticamente ligadas a «entradas» em sociedade que se resolvem em transmissões e aquisições.» A possibilidade de responsabilização subsidiária dos sócios em face do passivo social encontra-se prevista para as sociedades em nome coletivo e para os sócios comanditados nas sociedades em comandita (artigos 175.º, n.º 1, e 465.º, n.º 1, do Código das Sociedades Comerciais). Assim não é, no entanto, no que res- peita às sociedades por quotas – salvo previsão no estatuto social (artigo 198.º do Código das Sociedades Comerciais) –, às sociedades anónimas e às sociedades em comandita quanto aos sócios comanditários. Efetivamente, nestas últimas estruturas será unicamente a sociedade a responder pelas dívidas sociais (artigo 197.º, n.º 3, 271.º e 465.º, n.º 1, do Código das Sociedades Comerciais). Por seu turno, o regime de dissolução e liquidação das sociedades, constante nos seus traços funda- mentais dos artigos 141.º a 165.º do Código das Sociedades Comerciais e do Regime jurídico dos procedi- mentos administrativos de dissolução e de liquidação de entidades comerciais (RPAD), aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de março, alterado pelos Decretos-Leis n. os 8/2007, de 17 de janeiro, 318/2007, de 26 de setembro, 90/2011, de 25 de junho, 209/2012, de 19 de setembro, e 250/2012, de 23 de novembro, estatui que, verificada causa de dissolução do ente (seja causa de dissolução imediata, por decurso de prazo fixado nos estatutos, deliberação dos sócios, realização completa do objeto social, declara- ção de insolvência, ou outro facto previsto nos estatutos, seja causa de dissolução administrativa, seja causa de dissolução oficiosa), se inicia de imediato a liquidação (artigo 146.º, n.º 1, do CSC), que culmina com a morte e desaparecimento do ente societário, uma vez registado o respetivo encerramento (artigo 160.º, n.º 2, do CSC). Durante a fase de liquidação, destinada ao apuramento da situação patrimonial da sociedade (o que implica a realização do ativo patrimonial, a satisfação do passivo e a determinação do destino do respetivo saldo líquido), esta mantém a personalidade jurídica e, salvo disposição em contrário, continua sujeita ao regime que rege as sociedades não dissolvidas (artigo 146.º, n.º 2, do CSC), manifestando nos respetivos atos a sua nova condição, através do aditamento à firma da sociedade da menção «sociedade em liquidação»
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