TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
64 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Na expressão do Acórdão n.º 362/15 (reproduzida no Acórdão n.º 270/17), “a situação do responsável subsidiário do contribuinte devedor insolvente em face da Administração fiscal não é idêntica. Neste caso – que corresponde à posição do ora recorrente – está-se fora do âmbito do processo de insolvência, uma vez que, mediante a reversão, a Administração fiscal continua a poder exigir o crédito tributário àquele respon- sável. Na verdade, e como é justamente salientado pelo recorrente e bem assim no voto de vencido aposto ao acórdão recorrido (fls. 287 e seguintes), a suspensão decorrente do artigo 100.º do CIRE não impede a Administração fiscal de efetivar a responsabilidade subsidiária por reversão do processo de execução fiscal, com fundamento na «fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal» (cfr. o artigo 23.º, n. os l e 2, da LGT).». E o mesmo aresto prossegue: “Embora o artigo 100.º do CIRE não contenha, no seu teor literal, disciplina especialmente dirigida às dívidas tributárias, o certo é que a interpretação com que o mesmo foi aplicado no presente caso ao recorrente pressupõe que o mesmo preceito preveja uma causa de suspensão da prescrição em virtude da declaração de insolvência, adi- cional àquelas que se encontram previstas na LGT. E essa nova causa de suspensão teve repercussão direta no prazo de prescrição invocável pelo recorrente na qualidade de responsável subsidiário. Assim, embora não traduzindo uma modificação do regime geral da prescrição, a interpretação normativa do artigo 100.º do CIRE acolhida pelo tribunal a quo originou necessariamente, ao menos no que se refere aos responsáveis subsidiários, uma nova causa de suspensão do referido prazo, não decorrente do regime geral aplicável nem de qualquer outra norma produ- zida ou autorizada pela Assembleia da República, enquanto órgão constitucionalmente habilitado a legislar nesta matéria. Por isso, conclui-se sem margem para dúvidas que tal interpretação contende com matéria integrada nas garantias dos contribuintes, para os efeitos do disposto no artigo 103.º, n.º 2, da Constituição”. Em suma, do ponto de vista do responsável subsidiário, a norma em crise cria uma nova causa de sus- pensão da prescrição (a insolvência de outrem), declarada em processo em que este não é parte e sem que o Governo haja sido para tal autorizado. Não se encontra na Lei n.º 39/2003, de 22 de agosto, qualquer credencial para determinar a suspensão de dívidas tributárias exigidas a sujeitos que não estão no processo de insolvência. Assim, independentemente da questão de saber se o autorizado regime falimentar implica a suspensão das dívidas fiscais exigidas ao insolvente, não existe habilitação suficiente para afetar as garantias dos responsáveis subsidiários. 14. De acordo com a segunda linha de argumentação, a necessária habilitação constaria da alínea a) do n.º 3 do artigo 1.º da Lei n.º 39/2003, de 22 de agosto, uma vez que a mesma legitima o Governo a legislar sobre as “consequências decorrentes do processo especial de insolvência para o Estado e a capacidade do insolvente ou seus administradores”. A definição do sentido e extensão das alterações a introduzir seria depois, de acordo com o n.º 5 do mesmo artigo 1.º, especificado nos artigos subsequentes. Contudo, na disposição correspondente à definição do sentido e extensão das alterações a legislar pelo Governo em matéria de “consequências decorrentes do processo especial de insolvência para o Estado e a capacidade do insolvente ou seus administradores” – artigo 2.º – nada se encontra quanto à matéria relativa às consequências decorrentes do processo especial de insolvência para o Estado. Acresce que a aludida alínea a) do n.º 3 do artigo 1.º da Lei n.º 39/2003, por si só, não é suficiente para conferir ao Governo legitimidade para adotar uma regra correspondente à interpretação normativa sob análise. Nesse sentido, entendeu-se no Acórdão n.º 362/15 (e foi replicado no Acórdão n.º 270/17): “Uma autorização legislativa não se basta com a utilização de «termos abrangentes» dos quais se possa induzir as matérias sobre as quais o Governo fica habilitado a legislar. Como se salientou no Acórdão n.º 6/14, «os decretos- -leis autorizados que estejam em desconformidade com os termos da autorização, como é o caso em que excedam os limites da autorização e legislem sobre matéria diferente ou em sentido divergente do autorizado, incorrem em
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