TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
65 acórdão n.º 557/18 direta violação da competência legislativa da Assembleia da República e, logo, em inconstitucionalidade orgânica, total ou parcial». Por outro lado, e como também se assinalou no referido aresto, fazendo alusão à doutrina con- sagrada no Acórdão n.º 168/02, «a eventual dissonância do decreto-lei autorizado relativamente à autorização legislativa depende da aplicação das regras de interpretação jurídica, cabendo ao Tribunal Constitucional avaliar o sentido e alcance da credencial legislativa e determinar se as disposições editadas pelo Governo se incluem ainda dentro da competência legislativa que foi especialmente concedida por efeito da autorização». Uma eventual falta de coerência técnico-legislativa do diploma não seria argumento suficiente para uma cen- sura do ponto de vista constitucional. Mas é um dado relevante na tarefa de interpretar o sentido da autorização legislativa por forma a podermos concluir se a mesma inclui – ou não – a autorização para o Governo legislar em matéria de prescrição tributária. Ainda que se pudesse entender que na expressão «consequências para o Estado da declaração de insolvência» se incluiria autorização para alterar o regime da prescrição tributária, sempre seria a mesma insuficiente para constituir uma credencial legiferante válida. Com efeito, como decorre do disposto no n.º 2, do artigo 165.º da Constituição, as leis de autorização legisla- tiva devem definir o objeto, o sentido e a extensão da autorização. Torna-se a todos os títulos claro que o sentido e extensão significam a «predefinição parlamentar da orientação política da medida legislativa a adotar» (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada , vol. II, 4.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2010, p. 337). Não sendo obrigatório que “a autorização contenha um projeto do futuro decreto-lei (...), [ela] não pode ser, seguramente, um cheque em branco” (v. idem , ibidem ). Ora, do disposto no artigo 1.º, n.º 3, alínea a) , da Lei n.º 39/2003, de 22 de agosto, na parte referente às consequências para o Estado da declaração de insolvência, não decorre a concessão de autorização para legislar em matéria relativa à prescrição das dívidas fiscais. Assim, e uma vez que aquela expressão se encontra, na economia do diploma autorizativo, desligada de qualquer especificação quanto ao seu conteúdo, da mesma não é extraível qual- quer sentido útil, face às exigências do disposto no artigo 165.º, n.º 2, da Constituição, para efeitos de credencial parlamentar bastante. Do mesmo modo, também no resto do diploma não se encontra nada que pudesse agora conferir uma fonte útil de credencial legiferante para matérias relacionadas com a prescrição de dívidas tributárias, designadamente do responsável subsidiário”. Em conclusão, a Lei n.º 39/2003, de 22 de agosto, nomeadamente o seu artigo 1.º, n.º 3, alínea a) , não habilita o Governo a determinar a suspensão da prescrição das dívidas tributárias imputáveis ao devedor sub- sidiário por força da declaração de insolvência do devedor principal. Assim, a norma extraída do artigo 100.º do CIRE, segundo a qual a declaração de insolvência suspende o prazo de prescrição das dívidas tributárias imputáveis ao devedor subsidiário no âmbito do processo tributário, enferma de inconstitucionalidade orgâ- nica, uma vez que, sendo imputável ao Governo, e respeitando a matéria de reserva relativa da Assembleia da Republica nos termos do artigo 165.º, n.º 1, alínea i) , da Constituição, a sua edição não foi autorizada por esta mesma Assembleia. III – Decisão Pelo exposto, decide-se declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do artigo 100.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março, interpretada no sentido de que a declaração de insolvência aí prevista suspende o prazo pres- cricional das dívidas tributárias imputáveis ao responsável subsidiário no âmbito do processo tributário, por violação do artigo 165.º, n.º 1, alínea i) , da Constituição da República Portuguesa. Sem custas.
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