TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018

70 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL pode ser condicionada por qualquer decisão adicional, por conseguinte, a ausência de possibilidade de recurso implica a imediata restrição forçada da sua liberdade o que demonstra o imperativo de se reconhecer ao condenado o direito ao recurso enquanto valor garantístico próprio – e único! – no quadro das garantias de defesa constitucionalmente asseguradas ao arguido; tendo o direito ao recur- so, enquanto garantia de defesa, uma função primordial precisamente na prevenção da condenação injusta, não se exigindo dupla conforme na norma em apreço, a probabilidade de haver erro judiciário é naturalmente maior – ceteris paribus – do que nas situações em que a Relação confirma a decisão de primeira instância. XIII - O desvalor constitucional que se identifica na impossibilidade de interpor recurso da condenação em pena de privação da liberdade proferida pelo tribunal de recurso em reversão da absolvição de 1.ª ins- tância, não tem paralelo nos casos em que à revogação da sentença absolutória proferida em primeira instância se segue a aplicação de uma pena de multa; diante destas circunstâncias, a compressão do conteúdo do direito ao recurso traduzida na impossibilidade de impugnar as consequências jurídicas do crime impostas na primeira decisão condenatória quando estas se saldam na imposição de uma pena de prisão representa um sacrifício dos direitos fundamentais do arguido de tal ordem que não encontra já fundamento suficiente no propósito em si legítimo de racionalização do acesso ao Supre- mo Tribunal de Justiça. XIV - Ainda que, no contexto em questão, a Constituição não atribua ao direito ao recurso uma proteção absoluta, negar ao arguido a possibilidade de se defender – ex post facto – desta decisão constitui uma afetação de tal modo relevante da posição da defesa que sempre exigiria, como contrapeso valorativo, a justificação num interesse público de relevo equivalente; ao negar o acesso a uma reapreciação por um tribunal superior (no caso o Supremo Tribunal de Justiça) a norma atinge o direito ao recurso de forma excessivamente gravosa porquanto de consequências fundamentais na posição jurídica do arguido, designadamente na sua liberdade sendo, por isso, inconstitucional por violar o artigo 32.º, n.º 1, conjugado com o artigo 18.º, n.º 2, da Constituição. Acordam, em Plenário, do Tribunal Constitucional: I – Relatório 1. O representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional requereu, ao abrigo do disposto nos artigos 281.º, n.º 3, da Constituição e 82.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82, de 15 de novembro [LTC]), a apreciação e declaração, com força obrigatória geral, da norma que estabelece «a irrecorribilidade do acórdão da Relação que, inovadoramente face à absolvição ocorrida em 1.ª instância, condena os arguidos em pena de prisão efetiva não superior a cinco anos», resultante do artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do Código de Processo Penal (CPP), na redação da Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro. Legitima o presente pedido com a circunstância de a referida dimensão normativa já ter sido julgada incons- titucional, por este Tribunal, em pelo menos três casos concretos, facto evidenciado pelo Acórdão n. os 429/16, proferido em Plenário, seguido das Decisões Sumárias n.º 664/16 (2.ª Secção), e n.º 132/18 (1.ª secção).

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