TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018

74 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL n.º 08P1879), que optavam pela aplicação da norma resultante da interpretação literal da alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º, e admitiam, portanto, o recurso dos acórdãos proferidos, em recurso, pelas Relações que aplicassem pena de prisão inferior a cinco anos, desde que não houvesse dupla conforme – caso em que seria de aplicar a alínea f ) da mesma disposição. No Acórdão n.º 591/12, o Tribunal Constitucional (1.ª Secção) viria, porém, a julgar inconstitucional por violação do princípio da legalidade penal, a interpretação segundo a qual «é irrecorrível o acórdão profe- rido pelas Relações, em recurso, que aplique pena privativa da liberdade inferior a cinco anos, quando o tri- bunal de primeira instância tenha aplicado pena não privativa da liberdade». Este julgamento foi confirmado pelo Plenário do Tribunal no Acórdão n.º 324/13. Foi neste contexto que a Lei n.º 20/2013 veio consagrar expressamente a solução mais restritiva do âmbito do direito ao recurso. d) Enquadramento constitucional: o direito ao recurso como garantia de defesa em processo penal pre- vista no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição 10. As decisões que estão na base do presente pedido julgaram a norma em referência inconstitucional por violação do direito ao recurso enquanto garantia de defesa em processo criminal (artigo 32.º, n.º 1, da Constituição). 11. A análise deste direito fundamental deve começar pelo seu enquadramento face a outras sedes vin- culativas para o ordenamento português. O Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos (PIDCP) [aprovado para ratificação por Por- tugal pela Lei n.º 29/78, de 12 de junho] prevê, no seu artigo 14.º, n.º 5, que «Qualquer pessoa declarada culpada de crime terá o direito de fazer examinar por uma jurisdição superior a declaração de culpabilidade e a sentença em conformidade com a lei». Por seu turno, a Convenção para Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (CEDH) [aprovada para ratificação por Portugal pela Lei n.º 65/78, de 13 de outubro] não contempla expressamente o direito ao recurso entre as garantias de defesa do arguido. Tal não deve influenciar, por si só, a interpretação do direito ao recurso estabelecido na Constituição, pois a própria Convenção estabelece, no seu artigo 53.º, que nenhuma das suas disposições pode ser «interpretada no sentido de limitar ou prejudicar os direitos do homem e as liberdades fundamentais que tiverem sido reconhecidos de acordo com as leis de qualquer Alta Parte Contratante ou de qualquer outra Convenção em que aquela seja parte». Nem faria sen- tido, no contexto da dogmática dos direitos fundamentais, recorrer à CEDH para fazer uma interpretação restritiva do direito ao recurso constitucionalmente consagrado na República Portuguesa. Neste contexto, o artigo 2.º do Protocolo n.º 7 à CEDH estabelece o «direito a um duplo grau de jurisdição em matéria penal». No n.º 1 deste preceito consagra-se o direito de acesso de «qualquer pessoa declarada culpada de uma infração penal por um tribunal» a «uma jurisdição superior» que reexamine «a declaração de culpabilidade ou a condenação» – é autorizada igualmente a regulação do seu exercício e dos respetivos fundamentos por lei. Entre as exceções possíveis a este direito, o n.º 2 do mesmo preceito elenca as «infrações menores, definidas nos termos da lei» e as situações em que «o interessado tenha sido julgado em primeira instância pela mais alta jurisdição» ou as situações em que, após um julgamento que tenha conduzido a uma absolvição, «o interessado tenha sido (…) declarado culpado e condenado» em julgamento de recurso. Relativamente às garantias de defesa deste julgamento de recurso que, após absolvição, conduz a uma declaração de culpa e condenação do arguido, existe abundante jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH), em especial tendo como parâmetro o artigo 6.º, n.º 1, da Convenção – que consagra o “direito a um processo justo e equitativo” (vide, por exemplo, os acórdãos nos casos Constanti- nescu c. Roménia , n.º 28871/95, §§ 55 e 59, de 27 de junho de 2000; Destrehem c. França , n.º 56651/00,

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