TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
84 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL III – Decisão Pelo exposto, o Tribunal Constitucional declara, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma que estabelece a irrecorribilidade do acórdão da Relação que, inovadoramente face à absolvição ocor- rida em 1.ª instância, condena os arguidos em pena de prisão efetiva não superior a cinco anos, constante do artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do Código de Processo Penal, na redação da Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro, por violação do artigo 32.º, n.º 1, conjugado com o artigo 18.º, n.º 2, da Constituição. Lisboa, 13 de novembro de 2018. – Maria de Fátima Mata-Mouros – Gonçalo Almeida Ribeiro (com declaração) – José Teles Pereira – Lino Rodrigues Ribeiro – Joana Fernandes Costa – Claudio Monteiro – João Pedro Caupers – Maria Clara Sottomayor – Maria José Rangel de Mesquita (vencida, nos termos da declaração de voto aposta ao Acórdão n.º 429/16) – Fernando Vaz Ventura (vencido, nos termos da declaração de voto que junto) – Catarina Sarmento e Castro (vencida. Mantenho a posição assumida no Acórdão n.º 163/15 e na declaração de voto aposta o Acórdão n.º 429/16) – Pedro Machete (vencido nos termos da declaração junta) – Manuel da Costa Andrade (com declaração de voto). DECLARAÇÃO DE VOTO Subscrevi a decisão de inconstitucionalidade por imperativos de segurança e de integridade. Com efeito, tendo o plenário do Tribunal Constitucional, intervindo no âmbito de recurso de «oposição de julgados» previsto no artigo 79.º-D da LTC, julgado inconstitucional, através do Acórdão n.º 429/16, a dimensão normativa objeto do presente processo – ou seja, há cerca de dois anos −, seria incompreensível que se pro- movesse agora uma nova inversão de jurisprudência, ainda que na atual composição se formasse uma maio- ria nesse sentido. É certo que o Acórdão n.º 429/16, prolatado num processo de fiscalização concreta, não constitui uma pronúncia com força obrigatória geral; mas constitui uma pronúncia do plenário sobre a exata questão que agora se lhe colocou no âmbito de um processo de fiscalização abstrata aplicável à «repetição de julgados», nos termos do artigo 82.º da LTC. Creio que uma jurisdição constitucional responsável cultiva aquele mínimo de stare decisis sem o qual as suas decisões não constituem uma verdadeira e própria jurisprudência, obedecendo apenas aos ventos da opi- nião e aos caprichos do momento. Não quero com isto dizer – e isto merece ser enfatizado − que as inversões jurisprudenciais são ilegítimas; na verdade, mesmo nos sistemas jurídicos em que os tribunais reconhecem força jurídica ao precedente, não é invulgar os tribunais superiores alterarem jurisprudência que reputam obsoleta ou injusta. Nem de outro modo se pode conceber o dever de administrar a justiça. Mas o ponto de referência de tudo isto é a instituição, sede duradoira de autoridade pública, e não os indivíduos que tran- sitoriamente a protagonizam. Não são admissíveis mutações jurisprudenciais em curtíssimos intervalos de tempo, ditadas exclusivamente pela contingência da opinião, sem que tenham surgido quaisquer dados ou argumentos que não tenham sido ponderados nas decisões anteriores e sem que estas constituam, no enten- dimento dos juízes que são chamados a apreciar a questão ex novo , erros ou injustiças tão graves que o dever de promover a sua correção prevaleça sobre os imperativos de segurança e de integridade que reclamam o respeito pelo acquis jurisprudencial. Por esta razão, subscrevo a declaração de inconstitucionalidade da norma, extraída da alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º do Código de Processo Penal, que estabelece a irrecorribilidade do acórdão da Relação que condena o arguido absolvido em 1.ª instância em pena de prisão efetiva não superior a cinco anos. – Gonçalo de Almeida Ribeiro.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=