TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018

99 acórdão n.º 675/18 de Lisboa de 19 de janeiro de 2017 (proc. 3190-16-7T8FNC-B.L.1-8); o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 3 de novembro de 2015 (proc. 1161/15.OT8VFX-E.L1-1), afirmou que “entender-se que o parecer do administrador provisório se impõe ao devedor é fazer perigar a garantia a um processo equitativo, no sentido de as partes não serem privadas de expor os seus motivos, antes de o tribunal se poder pronun- ciar”; o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 8 de julho de 2015 (proc. 801/14.2TBPBL-C-C1) declarou “isso gera não um problema de ilegalidade, antes coloca a questão de conformidade da lei com a Constituição. O que sai violado não é princípio legal do contraditório expresso no Código de Processo Civil ou no CIRE (que também aqui não é princípio absoluto), é o direito a um processo equitativo em que o direito de defesa esteja assegurado. Com efeito, não nos parece admissível que, numa situação em que o deve- dor não aceita o pedido de insolvência e, portanto, não confessa a sua situação de insolvência, se interprete os artigos 17.º-G, n.º 4 e 28.º do CIRE, como o devedor estando, por força do parecer do Administrador Judicial Provisório (AJP) a confessar essa situação de insolvência”; e os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 26 de março de 2015 (proc. 89/15.8T8AMT-C.P1) e do Tribunal da Relação de Évora de 15 de julho de 2015 (proc. 529/14.3T8STB-E.E1) propuseram uma interpretação conforme à Constituição, obrigando à citação do devedor para se pronunciar em momento anterior à declaração da insolvência como forma de assegurar a conformidade constitucional da norma. Na doutrina, pela inconstitucionalidade se pronunciaram Alexandre Soveral Martins ( Um Curso de Direito de Insolvência , 2.ª edição, Almedina, 2016, p. 550, e “O P.E.R. – Processo Especial de Revitalização”, AB Instantia, Ano 1, n.º 1, 2013, p. 38), afirmando que “se o devedor não pode pronunciar-se sobre um concreto requerimento de declaração de insolvência, não lhe é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos e, sobretudo, é violado o seu direito a uma decisão mediante processo equitativo”; Catarina Serra ( O Processo Especial de Revitalização na Jurisprudência, Almedina, Coimbra, 2016, p. 91, sufragando tal interpretação e entendendo que o sentido normativo em crise não encontra “justificação para que o devedor visse o seu direito fundamental de defesa ou contra- ditório drasticamente diminuído”, razão pela qual sustenta que tem de “dar-se ao devedor a oportunidade de exercer o direito ao contraditório”); e Rita Mota Soares (“As consequências da não aprovação do plano de recuperação”, I Colóquio de Direito da Insolvência de Santo Tirso, org. Catarina Serra, Almedina, 2014, p. 105, sustentando que “interpretando o n.º 4 do artigo 17.º-G do CIRE no sentido de que o devedor discordante do parecer pela insolvência apresentado pelo AJP no PER não poderá opor a sua solvência em momento anterior a tal declaração […], estar-se-á a vedar ao referido devedor a prevenção, em tempo útil, de uma ameaça ou violação do seu direito, sem que se perceba o carácter necessário, adequado e proporcional dessa restrição”). Convergindo no juízo de inconstitucionalidade mas retirando tal conclusão da violação de outros direitos fundamentais, Nuno Salazar Casanova e David Sequeira Dinis (cit., p. 165), considerando que a atribuição ao administrador judicial provisório do poder de «confessar» a situação de insolvência con- figura uma restrição excessiva ao direito de propriedade e ao direito de liberdade empresarial do devedor e, ainda, Rita Mota Soares (cit., p. 104) que, para além de sufragar a violação do direito à tutela jurisdicional efetiva, vislumbra uma transgressão do princípio da igualdade “pela injustificada diferença de tratamento relativamente a um devedor em idêntica situação mas que esperou pela actuação dos credores”, já que aquele poderia invocar a sua solvência em momento prévio à declaração de insolvência. 8. Parecem não restar dúvidas de que a norma em crise comprime um direito fundamental a que é aplicável o regime dos direitos, liberdades e garantias. Não colhe a argumentação de que está suficientemente acautelado o princípio do contraditório pelo facto de o administrador judicial provisório ouvir o devedor antes de elaborar o seu parecer e pela circunstân- cia de o devedor poder impugnar a declaração de insolvência.

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