TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

1038 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL A lista apresentada pelo Partido Nós, Cidadãos! cumpre, assim, o requisito de intercalação fixado no n.º 2 do artigo 2.º da Lei da Paridade e, consequentemente, o limite mínimo de representação de cada sexo estabelecido no respetivo n.º 1. Assiste, por isso, razão ao recorrente. III – Decisão Pelo exposto, decide-se conceder provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida. Lisboa, 12 de setembro de 2019. – Joana Fernandes Costa – Pedro Machete – Lino Rodrigues Ribeiro – Gonçalo Almeida Ribeiro – Fernando Vaz Ventura – Claudio Monteiro (vencido, conforme declaração junta) – João Pedro Caupers (com declaração de voto). DECLARAÇÃO DE VOTO Votei vencido por entender que, embora as candidaturas sejam únicas, as listas de candidatos efetivos e de candidatos suplentes são organizadas separadamente e as regras da paridade estabelecidas no artigo 2.º da Lei Orgânica n.º 3/2006, de 21 de agosto, devem ser respeitadas autonomamente em cada uma delas. Permitir que os candidatos do sexo menos representado sejam relegados para a lista de candidatos suplentes para satisfazer o requisito estabelecido no n.º 1 daquele artigo frustra o objetivo da paridade que a lei visa alcançar pois, dessa forma, mesmo respeitando a regra estabelecida no n.º 2, que não permite mais do que dois candidatos seguidos do mesmo sexo, a percentagem mínima dos candidatos efetivos do sexo menos representando é reduzida, em média, em dez por cento, ficando assim muito aquém dos quarenta por cento legalmente estabelecidos. – Claudio Monteiro. DECLARAÇÃO DE VOTO Votei favoravelmente a decisão tomada e a respetiva fundamentação, por se traduzir na aplicação de lei expressa. Todavia, não posso deixar de manifestar a minha discordância relativamente à solução plasmada no artigo 2.º da Lei de Paridade nos Órgãos Representativos do Poder Político. A lei em questão teve por objetivo, reconhecido publicamente, incentivar a participação política das mulheres, que se tinha, e continua a ter, por insuficiente. Adotou-se, como instrumento concretizador de tal objetivo, aquilo que habitualmente se designa por sistema de quotas. Independentemente do que se pense de tal mecanismo, compreende-se e aceita-se que o legislador não tivesse assumido, na letra da lei, o incentivo explícito à participação política do sexo feminino, optando por uma formulação aparentemente neutra. Mas a formulação escolhida contraria o espírito da lei, na medida em que, ao invés de se limitar a incentivar a participação do sexo sub-representado na vida política, qualquer que fosse, obriga à representação de ambos os sexos – portanto também do sobre-representado – , afastando- -se da discriminação positiva. Em vez desta, impõe uma absurda quota mínima, igual, para cada um dos sexos – tanto o sub-represen- tado, como o sobre-representado – como se o objetivo tivesse de ser também a defesa da participação política igualitária dos homens e não fosse apenas a luta contra a insuficiente participação política das mulheres. Terá, porventura, o legislador esquecido que o ponto de partida não foi a igualdade – e a sua defesa – , mas a desigualdade – e o seu combate.

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