TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

1056 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL No caso de o reclamante não ver a sua pretensão atendida, poderá recorrer do indeferimento da sua rec- lamação para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do artigo 102.º-B da LTC, especificamente do seu n.º 7. Podemos encontrar exemplos de jurisprudência do Tribunal Constitucional neste contexto, de impugnação através do artigo 102.º-B da LTC do indeferimento da sua reclamação pelo presidente da câmara municipal, nos Acórdãos n. os  255/11, 258/11 e 267/11, todos do Plenário. 12. A CNE desempenha um papel central de “guardião” da regularidade e legalidade democráticas dos procedimentos eleitorais da República Portuguesa. No entanto, a sua atividade, como a de qualquer entidade administrativa, não escapa à necessária obediência ao princípio da legalidade. Como tem sido repetidamente afirmado por este Tribunal, «constitui princípio geral de direito público que os órgãos públicos, nomeadamente os administrativos, não podem dispor livremente das suas competên- cias: o quadro competencial tem que resultar de enquadramento legal» (cfr., v. g. , o Acórdão n.º 296/13, do Plenário, ponto 44). Aqui surge, como decorrência do princípio da legalidade, o princípio da precedência da lei, que estabelece que a atividade administrativa deve ter sempre como fundamento uma norma jurídica – cabendo assim à lei a definição primária das atuações administrativas. No entanto, perscrutando a LEAR e a Lei n.º 71/78, de 27 de dezembro, que criou a CNE, em especial o seu artigo 5.º, que especifica as suas competências, não é possível encontrar uma base legal para a delibera­ ção adotada. O controlo dos atos da administração eleitoral no âmbito do procedimento de designação dos membros da mesa das assembleias de voto é o descrito no ponto anterior do presente Acórdão, não sendo atribuída qualquer competência à CNE para aferir da legalidade ou determinar a repetição do sorteio. A competência para conhecer das reclamações relativas a este procedimento é atribuída ao presidente da câmara municipal pelo artigo 47.º, n.º 4, da LEAR; e a competência para conhecer da regularidade e validade dos atos que compõem esse procedimento pertence exclusivamente aos tribunais, e, em última instância, ao Tri- bunal Constitucional [artigos 113.º, n.º 7, e 223.º, n.º 2, alínea c), da Constituição]. 13. Diante do exposto, terá, pois, que se concluir que a CNE, ao adotar a deliberação objeto do presente recurso em que ultrapassou a mera recomendação, excedeu o âmbito das suas competências específicas. Tal circunstância projeta-se obviamente sobre a validade da decisão ora impugnada. Precludida fica, pois, a apreciação da questão de legalidade da deliberação suscitada no ponto ii) das conclusões do recurso, por se afigurar inútil. O recurso interposto pelo Município de Ílhavo obtém, assim, provimento. III – Decisão Pelo exposto, decide-se conceder provimento ao recurso interposto e considerar inválida a deliberação da CNE de 19 de setembro de 2019 no âmbito do Processo AR. P-PP/2019/61. Sem custas. Lisboa, 26 de setembro de 2019. – Maria de Fátima Mata-Mouros – Gonçalo Almeida Ribeiro – João Pedro Caupers – Maria José Rangel de Mesquita – Mariana Canotilho – Joana Fernandes Costa – Lino Rodrigues Ribeiro – Pedro Machete – José Teles Pereira – Manuel da Costa Andrade. Anotação: 1 – Acórdão publicado no Diário da República , II Série, de 8 de novembro de 2019. 2 – O Acórdão n.º 296/13 está publicado em Acórdãos, 87.º Vol..

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