TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

172 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL n.º 3), cuja proporcionalidade é apreciada pela formação especial de juízes criada pelo legislador e integrada organicamente no STJ], mas articulada necessariamente também com os demais traços do regime legal das medidas de acesso aos dados de tráfego, não violam o princípio da proporcionalidade, em especial na sua dimensão de proibição do excesso. Tal como considera o presente Acórdão quanto às medidas de acesso previstas no artigo 3.º (cfr. II, 12., p. 68), também se afigura possível identificar, com suficiente clareza, as razões justificativas das medidas – res- tritivas de direitos – consagradas no artigo 4.º da LO n.º 4/2017: a proteção de valores constitucionalmente consagrados. Tratando-se de acesso a metadados, concretamente dados de tráfego na aceção própria da LO n.º 4/2017, para efeitos de produção, pelos serviços de informação em causa, de informações necessárias à prevenção de atos de espionagem e do terrorismo, está em causa a prevenção de atos e condutas que, na sua essência, visam prejudicar valores essenciais do Estado com consagração constitucional: desde logo, no primeiro caso, interesses militares do Estado português relativos à independência nacional, à unidade e à integridade do Estado ou à sua segurança interna e externa [cfr. artigo 33.º, n.º 1, por remissão do artigo 34.º, n.º 1, alíneas a) e d), do CJM]; e, no segundo caso, a integridade e independência nacionais, funcionamento das instituições constitucionalmente previstas ou intimidação de pessoas, grupos de pessoas ou a população em geral, mediante a prática de certos atos que constituam crimes, em especial contra a vida, a integridade física ou a liberdade das pessoas (cfr. artigo 2.º, n.º 1, da Lei n.º 52/2003, de 22 de agosto, por remissão do artigo 4.º da mesma Lei). Ora, tais valores e interesses inerentes à ordem constitucional do Estado têm inequívoca consagração constitu- cional [cfr., em especial, artigos 1.º, 2.º e 3.º, 9.º, alíneas a) , b) e c) e 11.º, n.º 1] e de cuja salvaguarda depende igualmente a salvaguarda dos direitos, liberdades e garantias consagrados na Lei Fundamental. O acesso aos dados de tráfego previsto no artigo 4.º e com os objetivos aí fixados não merece – tal como não merece o acesso aos dados previsto no artigo 3.º (que, pese embora os conceitos aí utilizados [dados de base e dados de localização de equipamento «quando não deem suporte a uma concreta comunicação»], tam- bém abrange, em rigor, dados de tráfego) – censura no que respeita à sua adequação e necessidade: não só a medida de acesso aos dados de tráfego ínsita no artigo 4.º da LO n.º 4/2017 configura um meio idóneo para alcançar o fim de produção de informações necessárias à prevenção de atos de espionagem e do terrorismo, como não se afigura evidente a existência de meios menos lesivos (i.e, menos restritivos dos direitos funda- mentais em causa) suscetíveis de, com igual eficácia, alcançar os objetivos traçados pelo regime de acesso. Assim, a eventual desproporção da medida de acesso em causa só poderia resultar da aferição da sua proporcionalidade em sentido estrito, com recurso a uma metodologia de ponderação de bens, ou seja, da aferição da sua justa medida face à prevalecente valia dos fins de interesse público e valores do Estado em causa, também pressuposto e condição da salvaguarda de outros valores igualmente com relevância constitu- cional. Entende-se, porém, que não há violação do princípio da proporcionalidade na vertente de proibição do excesso, inexistindo violação da proporcionalidade em sentido estrito. Para a formulação de tal juízo de não violação da proporcionalidade em sentido estrito, ou seja, para a conclusão de que o sacrifício imposto aos direitos fundamentais dos visados pela medida de acesso aos dados de tráfego (e, por maioria de razão aos dados de base e de localização de equipamento na aceção da LO n.º 4/2017) não excede a justa medida, no confronto com os fins visados, afiguram-se essenciais os traços do regime de acesso aos dados contido na LO n.º 4/2017– em que se insere a norma do artigo 4.º sindicada – supra enunciados em A1, i) a iv) , quanto à iniciativa, na vertente da fundamentação do pedido e seu objeto, ao controlo judicial e autorização prévia, à apreciação judicial e ao regime de garantias instituído, os quais não foram cabalmente considerados pela fundamentação subscrita pela maioria. Na apreciação em causa relevam em particular, os elementos do regime atrás indicados que apontam para a contenção – ao estritamente necessário – da medida de acesso aos dados (justa medida), desde logo – e em termos que se consideram determinantes – tratar-se de uma medida de acesso a dados direcionada ou selectiva [artigos 6.º, n.º 1, alínea a) , e 9.º, n.º 2], com base numa suspeita concreta e individualizada (artigo 9.º, n.º 3) e que, além da sua duração temporal limitada, não só não se estende à totalidade dos dados

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