TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

173 acórdão n.º 464/19 previamente armazenados pelos prestadores de serviços de comunicações eletrónicas (independentemente da questão da base jurídica em que se funda, a montante do acesso, tal armazenamento), como não admite a informação em larga escala, por transferência integral dos registos existentes, nem a ligação em tempo real às redes de comunicações eletrónicas (artigos 9.º, n.º, 3 e 6.º, n.º 2). Em especial, a aferição dos pressupostos (alternativos) da autorização do pedido [previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 6.º], se não dis- pensa a observância (pelo requerente) dos elementos que constituem a fundamentação do pedido de acesso, inclusive os factos que o suportam, as finalidades e as razões das medidas pontuais de acesso requeridas e a identificação da pessoa ou pessoas, caso sejam conhecidas, envolvidas nos factos [cfr. alíneas b) e c) do n.º 2 do artigo 9.º] – o «juízo de prognose ou da avaliação» feito pelos serviços a que alude a maioria – igualmente não dispensará a sua verificação e ponderação («ponderação da relevância dos fundamentos do pedido», con- forme previsto no artigo 5.º, n.º 1) pela entidade que autoriza, em moldes que não se concebem meramente ‘automáticos’ ou, como parece indicar a maioria, levando a cabo uma apreciação só em função do que os ser- viços ‘formalmente’ enunciarem no pedido, assim referenciando qualquer cidadão como «alvo» ou qualquer situação como «urgente» [alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 6.º]. Ora, relevam igualmente para tal apreciação e ponderação os traços de regime (atrás apontados) rela- tivos à autorização prévia, seja quanto à natureza do ente competente, seja quanto aos pressupostos de que depende a decisão autorizativa, seja, ainda, quanto aos critérios que presidem à apreciação e decisão. Neste âmbito entende-se, ao invés da maioria, relevar também de modo determinante para o juízo de proporcio- nalidade em sentido estrito a natureza do ente competente para a autorização prévia (e controlo) – forma- ção específica das secções criminais do STJ, composta apenas por magistrados (mais antigos) que integram aquelas secções. Ora, ainda que, como sustenta a maioria se estivesse tão só «perante uma atuação de natureza administrativa e não judicial» (cfr. II, 11. A questão da constitucionalidade do artigo 4.º da Lei Orgânica n.º 4/2017), a natureza da formação em causa (formação organicamente emanada das seções criminais do STJ) e a qualidade de magistrado judicial dos membros que a integram, com os atributos próprios dessa função, em especial a independência, se apresentam como especiais elementos garantísticos, quer da veri- ficação do preenchimento dos pressupostos de que depende a autorização [em particular os mencionados nos artigos 6.º, n. os 1, alíneas a) e b) ] e da adequada fundamentação «de modo detalhado e circunstanciado» do pedido de acesso (artigos 9.º, n.º 2 e 3, em particular a suspeita concreta e individualizada e artigo 10.º, n.º 3, quanto às «informações claras e completas» a levar em conta na fundamentação da decisão quanto ao pedido), quer da aferição, necessariamente casuística e com base naqueles fundamentos, da necessidade, adequação e proporcionalidade do pedido de acesso e da sua justa medida face aos fins previstos na lei de molde a salvaguardar os direitos, liberdades e garantias constitucionalmente previstos. Assim, as medidas de acesso aos dados em causa, porque determinadas no quadro de um procedimento de autorização particularmente exigente, segundo pressupostos e critérios que se afiguram densificados de modo suficiente, orientado pela sua ‘estrita necessidade’, não configuram um sacrifício dos direitos envolvi- dos que exceda a justa medida face aos prevalentes fins últimos ínsitos na norma sindicada – produção, pelos serviços em causa, de informações necessárias à prevenção de atos de espionagem e do terrorismo, i. e. , prevenção de atos e condutas que, constituindo tipos de ilícito criminal, visam na sua essência prejudicar ou pôr em perigo valores essenciais do Estado com previsão constitucional e condição da salvaguarda de outros valores igualmente com relevo constitucional, como a proteção de direitos fundamentais. Deste modo a proteção dos relevantes valores do Estado cuja prossecução se visa alcançar através das medidas sindicadas afigura-se sempre de particular grandeza e relevância em moldes que ainda permite justificar, em ponderação, o sacrifício de direitos fundamentais resultante do carácter restritivo das medidas – sublinhe-se, medidas pontuais de acesso, seletivas, casuísticas, orientadas pelo princípio da necessidade de conhecer e limitadas no tempo – de acesso aos dados de tráfego [na aceção da alínea c) do n.º 2 do artigo 2.º da LO n.º 4/2017], sem que as mesmas se afigurem excessivas para alcançar os fins do Estado em causa, não tendo por isso o legislador ordinário excedido a sua justa medida.

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