TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

185 acórdão n.º 774/19 Almedina, Coimbra, 2018, p. 19; acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de outubro de 2013, proc. 70/11.6TTLSB.L1.S1, e de 17 de novembro de 2016, proc. 394/10.0TTTVD.L1.S1). Em segundo lugar, e mesmo para a doutrina (hoje maioritária) que não considera haver impossibilidade, a opção visará proteger a independência dos administradores, prevenindo potenciais conflitos de interesses. Procurar-se-á assegurar que “o sujeito designado administrador exerce esse cargo sem as limitações que a posição no contrato de trabalho subordinado ou autónomo traria consigo” (cfr. Alexandre Soveral Martins, “Comentário ao artigo 398.º”, in Código das Sociedades Comerciais em Comentário , vol. VI, coord. Coutinho de Abreu, Almedina, Coimbra, 2013, p. 336; Coutinho de Abreu, “Sobre o trabalhador / administrador”, Para Jorge Leite – Escritos Jurídicos, vol. II, p. 5; Luís Brito Correia, Os Administradores de Sociedades Anónimas , Almedina, Coimbra, 1993, p. 575; Júlio Gomes, Direito do Trabalho, vol. I – Relações Individuais de Trabalho , 2007, p. 167, e “Da validade do contrato de trabalho uma sociedade de um grupo para o exercício de funções de administração social noutra sociedade do mesmo grupo”, Estudos de Direito do Trabalho em Homenagem ao Prof. Manuel Alonso Olea, Almedina, Coimbra, 2004, pp. 435 e 443; Ilídio Duarte Rodrigues, A Adminis- tração das sociedades por quotas e anónimas – organização e estatuto dos administradores , Lisboa Petrony, 1990, p. 304; Luís Miguel Monteiro, “Regime jurídico do trabalho em comissão de serviço”, Estudos de Direito do Trabalho em Homenagem ao Prof. Manuel Alonso Olea, Almedina, Coimbra, 2004, p. 512; Engrácia Antunes, cit. , pp. 14 e 16; Paulo de Tarso Domingues, cit. , p. 16; Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 1018/96; acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de outubro de 2013, proc. 70/11.6TTLSB.L1.S1, e de 25 de novembro de 2014, proc. 284/11.9TTTVD.L1.S1). Por fim, alude-se a uma finalidade de preservação do modelo legal de governação das sociedades anóni- mas, que atribui ao Conselho de Administração (e não aos trabalhadores) a competência quanto às decisões fulcrais da empresa, assentando num princípio de livre destituição dos administradores. A confusão nas mes- mas pessoas da posição de administrador e de trabalhador (cujo despedimento depende de justa causa) poria em causa tal arquétipo – cfr. Engrácia Antunes, cit. , p. 18; Ilídio Duarte Rodrigues, cit. , p. 307; Alexandra Marques Sequeira, “Da designação de trabalhador para membro de órgão estatutário da sociedade emprega- dora – efeitos no contrato de trabalho”, in Questões Laborais , n.º 46, 2015, p. 154; António José Sarmento Oliveira, “O contrato de administração. Sua natureza e possibilidade de cumulação com um contrato de trabalho”, in Revista de Ciências Empresariais e Jurídicas , n.º 5, 2005, p. 202. Ora, a eficácia da opção legislativa da incompatibilidade entre as posições de trabalhador e adminis- trador é garantida através de três normas: por um lado, pela proibição de os administradores celebrarem contratos de trabalho com a sociedade, ainda que com efeitos apenas para depois do cargo (n.º 1 do artigo 398.º do CSC) (i) ; por outro, no que tange aos trabalhadores que venham a ser designados como adminis- tradores, pela suspensão (ii) ou extinção (iii) do contrato de trabalho, consoante este tenha duração superior ou inferior a um ano (n.º 2 do artigo 398.º CSC). É este último segmento normativo cuja constitucionalidade se discute. Ainda que o legislador haja usado qualquer nomen iuris , trata-se, indiscutivelmente, de uma causa de caducidade do contrato de traba- lho, prevista especialmente em lei (cfr. Jorge Leite, Direito do Trabalho , vol. 2, SASUC, Coimbra, 2003, p. 198; Maria do Rosário Palma Ramalho, Tratado… , cit. , pp. 72 e 80; Engrácia Antunes, cit. , p. 29). 6.2. A diferenciação do tratamento dos contratos celebrados há menos de um ano (que se extinguem, em vez de se suspenderem) radicará na dissuasão de condutas fraudulentas. O legislador terá querido preve- nir que um sujeito estranho à sociedade celebrasse com esta um contrato de trabalho fictício, imediatamente antes da sua designação como administrador, com vista a assegurar a sua posição profissional depois das fun- ções sociais, à custa da sociedade (cfr. Coutinho de Abreu, “Administradores e trabalhadores de sociedades – cúmulos e não”, in Temas Societários, Almedina, Coimbra, 2006, p. 16, e Governação das Sociedades Comer- ciais , 2.ª edição, Almedina, Coimbra, 2010, p. 66; Ricardo Costa, Os Administradores de Facto das Sociedades Comerciais , Almedina, Coimbra, 2014, p. 806; Paulo de Tarso Domingues, cit. , p. 20, nota n.º 39; Ilídio Duarte Rodrigues, cit. , p. 193; Raul Ventura, “Nota sobre a interpretação do artigo 398.º do Código das

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