TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

188 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL «As situações previstas no n.º 2 do artigo 398.º são diversas das contempladas no seu n.º 1: enquanto que naquele estão em causa duas situações em que a pessoa que foi designada administrador da sociedade detinha, à data da designação, um vínculo laboral com a mesma sociedade, já na hipótese em apreço (a do n.º 1), previne-se a circunstância de o administrador designado adquirir, durante o exercício das funções de administração ou mesmo após a sua cessação, qualquer vínculo (laboral ou de prestação de serviços) com a sociedade administrada ou socie- dades que com esta estejam numa relação de domínio ou de grupo. Ou seja, na hipótese do n.º 1 do artigo 398.º não se verificam as razões em que o citado Acórdão n.º 1018/96 se fundamentou para incluir o n.º 2 do preceito, na parte citada, no conceito de legislação laboral. Na verdade, o n.º 1 não regula posições jurídicas de trabalhadores, enquanto tais, nem tem qualquer efeito directo e imediato numa relação de índole laboral. Pelo contrário, a norma tem como destinatário o administrador da sociedade − nessa exacta qualidade − e visa obstar a que este adquira a qualidade de trabalhador ou prestador de serviços da sociedade». Isto é, a disciplina do n.º 1 do artigo 398.º (que proíbe o administrador de celebrar um contrato de trabalho) dissocia-se do objeto normativo ora fiscalizado (que extingue um contrato de trabalho por efeito da designação como administrador): ali não existe qualquer situação laboral que seja regulada, densificada, suspensa ou extinta – simplesmente se obstando ao administrador a aquisição da qualidade de trabalhador. Pelo contrário, a regra do n.º 2 produz efeitos numa relação jurídico-laboral existente, extinguindo-a quando o contrato haja sido celebrado há menos de um ano. No fundo, a única semelhança entre as duas normas é o seu propósito, dirigindo-se ambas a assegurar a combater condutas fraudulentas e a assegurar a regra da incompatibilidade entre a posição de trabalhador e a de administrador. Em terceiro lugar, é relevante a Declaração de Voto do Conselheiro Pamplona de Oliveira aposta Acór- dão n.º 626/11, na qual se defende ser necessário “distinguir entre as intervenções legislativas directamente votadas à definição de «legislação do trabalho» e as que, visando um outro objectivo, acabam por interferir, de forma acidental ou meramente episódica, em matéria de natureza laboral”. Aplicando este critério, sus- tenta-se que “a análise da norma revela que a mesma não interfere na definição de qualquer tipo de direitos ou deveres dos trabalhadores que devesse reclamar a intervenção de representantes sindicais, e não altera o quadro legal em que se desenvolve o regime do contrato individual de trabalho, incluindo a sua cessação. Seria, por isso, de concluir que a norma, não interferindo em área que reclamasse a participação sindical, não ofende o citado princípio constitucional”. Nestes termos, sustentou o Conselheiro Pamplona de Oliveira que a definição da legislação do trabalho – que é restrita, como se verá, às normas diretamente dirigidas à estatuição do regime laboral – não abrange aquelas regras que, visando disciplinar outras matérias, acabam por produzir efeitos no contrato de trabalho. 8. Ao Tribunal Constitucional é posta, pois, a questão da qualificação da norma como integrante do conceito jurídico-constitucional como legislação do trabalho e, consequentemente, o problema da sua sujei- ção, no processo legislativo, à participação das associações sindicais e das comissões de trabalhadores. Con- formando-se os atos normativos com o parâmetro constitucional no seu todo (material, formal e procedi- mental) importa saber se foi respeitado o procedimento jurídico-constitucional de formação normativa (cfr. Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição , 7.ª edição, Almedina, Coimbra, 2003, pp. 919, 921 e 1321; Cardoso da Costa, “A justiça constitucional no quadro das funções do Estado vista à luz das espécies, conteúdo e efeitos das decisões sobre a constitucionalidade de normas jurídicas”, in Documentação e Direito Comparado – Boletim do Ministério da Justiça , n.º 27/28, 1987, p. 51). A redação da Constituição vigente à data da edição da norma em crise (na versão da Lei Constitucional n.º 1/82), consagrava o direito de participação das comissões de trabalhadores e das associações sindicais na alínea d) do artigo 55.º e na alínea a) do n.º 2 do artigo 57.º; ora, apesar de estas normas constitucio- nais não terem sofrido qualquer alteração de conteúdo [constando hoje, respetivamente, na alínea d) do n.º 5 do artigo 54.º e na alínea a) do n.º 2 do artigo 56.º da Constituição], a apreciação de um eventual

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