TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

192 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL regime da sua celebração, os deveres e obrigações das partes e a cessação do contrato (Acórdão n.º 64/91), incluindo os efeitos em matéria de aposentação (Acórdão n.º 360/03) e, muito especificamente, a previsão de causas de caducidade do contrato (Acórdão n.º 104/04). Por qualquer destes critérios, a introdução de uma causa de caducidade do contrato, enquanto causa da sua extinção, não pode deixar de ser entendida como contida no conceito jurídico-constitucional de legisla- ção do trabalho. Não haverá, provavelmente, outras matérias em que a caracterização como legislação laboral seja tão clara como, justamente, a da regulação da cessação dos contratos de trabalho. 8.3. Em sentido oposto, porém, podem descobrir-se duas linhas de argumentação divergente, susten- tando estar o legislador desonerado da obrigação de promover a participação das organizações representativas dos trabalhadores quanto a esta norma. Por um lado, e independentemente da questão de saber se a introdução de uma causa de caducidade constitui legislação do trabalho, pode sufragar-se que a norma fiscalizada não é inovadora, não tendo produ- zido qualquer alteração no regime aplicável. Com efeito, caso se aceite a conceção segundo a qual é impossí- vel a coexistência do vínculo laboral com a posição de administrador, pode defender-se que a regra em crise será somente uma especificação da regra estatuída no regime geral do trabalho [artigo 343.º, alínea b) , do Código do Trabalho] segundo a qual caducam os contratos de trabalho “Por impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva, de o trabalhador prestar o seu trabalho ou de o empregador o receber”. Se assim for, a norma fiscalizada não materializa qualquer inovação: o legislador mais não teria feito do que repetir, no Código das Sociedades Comerciais, a regra geral de caducidade por impossibilidade. Razão pela qual não teria introduzido qualquer nova causa de caducidade. Esta ideia é aflorada por Engrácia Antunes, que entende a impossibilidade definitiva como conceito jurídico, “abrangendo, designadamente, os casos em que a atividade que o trabalhador desempenhava vem a ser proibida por lei ou em que o trabalhador deixa de reunir os requisitos legais exigidos para o desempenho dessa atividade” ( cit. , p. 88), razão pela qual sustenta ser duvidoso que a estatuição da norma em crise cons- titua uma inovação face à regra de caducidade geral. Uma segunda linha argumentativa sustenta que a norma fiscalizada é materialmente comercial, não só pela sua origem e inserção sistemática, mas principalmente pelas finalidades subjacentes, marcadamente societárias, razão pela qual a afetação do contrato de trabalho é meramente reflexa ou mediata (Menezes Cordeiro, Manual de Direito das Sociedades , vol. I, 3.ª edição, Almedina, 2011, p. 924; e Código das Socieda- des Comerciais Anotado , 2.ª edição, 2011, p. 1063; Engrácia Antunes, cit. , pp. 73 e seguintes; Paulo Olavo Cunha, Direito das Sociedades Comerciais , 6.ª edição, Coimbra, Almedina, 2016, p. 795) Isto é, nesta orien- tação, a conformidade constitucional é asseverada pela adoção de um conceito mais restrito de “legislação de trabalho”, daí excluindo as normas que, visando regular outras matérias, produzem efeitos reflexos no regime laboral. A favor desta tese invocam-se, essencialmente, três argumentos. Por um lado, alude-se à inserção sistemática da norma no Código das Sociedades Comerciais e finali- dade subjacente (Menezes Cordeiro, ibidem ; Olavo Cunha, cit. , p. 795) e à circunstância de ela não ser espe- cificamente dirigida ao contrato de trabalho, já que determina também a extinção de contratos de trabalho autónomo (assumam eles o figurino de mandato, prestação de serviços ou outro), denunciando-se o carácter reflexo da afetação do regime laboral (Engrácia Antunes, ibidem ). Em segundo lugar, lembra-se que a jurisprudência do Tribunal Constitucional apenas classifica como legislação do trabalho as normas que diretamente afetam a posição dos trabalhadores, não tendo conside- rado abrangidas as regras relativas ao registo e comunicação do trabalho suplementar (Acórdão n.º 203/90) e à elaboração dos mapas de horário de trabalho (Acórdão n.º 262/90), as atribuições e competências dos órgãos administrativos que controlam o cumprimento das regras laborais (Acórdão n.º 355/91), as normas processuais sobre o valor da ação de impugnação do despedimento (Acórdão n.º 155/92), as leis de amnistia a infrações disciplinares em empresas públicas (Acórdão n.º 152/93), as normas sobre o enquadramento

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