TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

220 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 3.ª – No cenário B, a Relação confirma a decisão da Primeira Instância; o acórdão por si proferido será passível de revista nos termos do artigo 671.º, n.º 1, do C.P.C., uma vez que põe termo ao processo. 4.ª – Ainda no cenário B, a Relação revoga a decisão da Primeira Instância. A decisão da Relação, não pondo termo ao processo nem apreciando uma decisão interlocutória que recaia unicamente sobre a relação processual (mas antes uma decisão final da Primeira Instância), não será recorrível nem ao abrigo do artigo 671.º, n.º 1, nem ao abrigo do artigo 671.º, n.º 2, al. b) . 9. A consequência da situação normativa exposta é a seguinte: – Os Autores (a quem o acórdão da Relação, que põe termo ao processo, prejudica) podem sempre recorrer desse acórdão-– as hipóteses que se lhes aplicam – Já os Réus (a quem o acórdão da Relação de não pôr termo ao processo igualmente prejudica) podem recorrer desse Acórdão na 1.ª hipótese, mas não na 4.ª. 10. Nisto consiste no entender das Recorrentes a desigualdade de armas. Se o acórdão da Relação em causa fosse de confirmação do decidido pela Primeira Instância, os Autores poderiam recorrer. Já os Réus não o podem fazer, e, para cúmulo, apenas porque não houve consonância em seu desfavor entre o julgado pela Primeira Instância e pela Relação (uma tal consonância reconduzir-nos-ia à 1.ª hipótese, em vez de à 4.ª). 11. Colocada a questão nos termos que acabam de ver-se é fácil concluir, antes de mais, que o objeto do presente recurso não consiste em quaisquer designadas «normas jurisdicionais» ou «normas do caso», desti- tuídas de natureza política porque sem caráter inovatório ou eficácia externa, como se entendeu no Acórdão n.º 695/16. 12. No caso sobre o qual incidiu o citado aresto estava em causa um objeto de recurso formulado justifi- cado pelo aí Recorrente nos seguintes termos: «o tribunal a quo, partindo embora do caso concreto, extraiu uma norma aplicável a qualquer resolução de um contrato administrativo com base no seu incumprimento: a de que o procedimento conducente a essa resolução não configura um processo sancionatório (para efeitos do artigo 32.º n.º 10, da CRP), pelo que pode ser identificada uma «regra abstratamente enunciável» e também que «o tribunal a quo extraiu dos preceitos indicados uma norma aplicável à preterição do direito de audiência prévia em qualquer processo sancionatório [admite-se que com exceção dos processos criminais e contraorde- nacionais): a de que a preterição desse direito não consubstancia uma ofensa ao conteúdo essencial do direito fundamental (de audiência e defesa) estabelecido no artigo 32.º n.º 10, da CRP]. 13. Segundo o Acórdão n.º 695/16, «[a]mbos os enunciados, argumenta o recorrente, contêm uma “regra abstrata “, que “o tribunal a quo enunciou, ‘criou “’, o que bastaria para preencher o pressuposto processual de um objeto normativo». 14. Ora, o Tribunal Constitucional entendeu precisamente o contrário: o facto de uma decisão judicial “criar” uma norma para resolver o caso tem o efeito de a excluir como objeto idóneo da fiscalização concreta da constitucionalidade. 15. Por outras palavras, no caso sobre que incidiu o Acórdão n.º 605/16 estava-se perante uma norma juris- prudencial, criada pelo tribunal recorrido num domínio extra verbis legis, que o mesmo acórdão caracterizou como relevando de «razões das decisões jurisdicionais que não são recondutíveis a atos da autoridade pública dotados de força externa, ou seja, que o tribunal a quo não acolhe enquanto fonte de direito por força da sua subordinação ao princípio da legalidade mas que resultam da aplicação de direito para além da lei – obtido através de métodos como o preenchimento de conceitos indeterminados e a concretização de cláusulas gerais, o recurso à extensão analógica e à redução teleológica, ou a ponderação de princípios jurídicos – ou da inter- pretação de preceitos constitucionais diretamente aplicáveis, pela sua natureza ou por imposição legal, ao caso sub judice . Por outras palavras, suscetíveis de controlo pela jurisdição constitucional são, por princípio, apenas as razões heterónomas da justiça comum, aquelas normas infraconstitucionais que os tribunais aplicam em virtude da autoridade política, originária ou delegada, dos seus autores».

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