TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

226 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL processuais ínsito na garantia constitucional de um processo equitativo, consagrada no artigo 20.º, n.º 4, da Constituição, não é qualquer norma que estabeleça a irrecorribilidade do acórdão da Relação que revoga uma decisão de extinção da instância, por deserção, proferida pelo tribunal de primeira instância; é sim o juízo que, perante a previsão do n.º 2 do artigo 671.º do Código de Processo Civil, excluiu a possibilidade de subsumir à categoria legal de «acórdãos da Relação que apreciem decisões interlocutórias que recaiam unicamente sobre a relação processual» o «acórdão da Relação que revoga uma decisão da Primeira Instância de extinção da instância por deserção», com todos os efeitos daí decorrentes. Pelas razões já apontadas, tal juízo não integra o conceito funcional de norma, no sentido que lhe é dado pela jurisprudência constitucional. Isto é, o conceito de norma funcionalmente apto a assegurar que o Tribunal Constitucional exercerá os seus poderes de sindicância de acordo com a sua missão de legislador negativo, circunscrevendo a sua atividade à fiscalização do “critério heterónomo de decisão” de que o juiz é mediador, e não também do “juízo que [o juiz] há de emitir [emitiu] segundo o seu próprio critério (para o qual o legislador devolve – na grande massa das situações, até porque não pode ser de outro modo – e no qual confia)” (cfr. José Manuel M. Cardoso da Costa, Justiça constitucional e jurisdição comum…, cit., p. 209, nota 12). Ou, numa outra formulação ainda, que o exercício da jurisdição constitucional terá apenas por objeto as normas aplicáveis ao caso, com exclusão das puras normas de decisão – isto é, aquelas que, supondo uma conjugação entre o conteúdo expresso nos elementos estruturais da norma aplicável e os dados relevantes do caso, e dessa conjugação exclusivamente derivando, não emergem de enunciados normativos aprovados por autoridades competentes para a respetiva edição segundo as formas admitidas, mas antes da mediação que entre tais enunciados e as circunstâncias sub judice é levada a cabo pelo juiz a quo. Na medida em que se limita a estabelecer a solução jurídica do caso através da afirmação de que, em face da norma aplicável («os acórdãos da Relação que apreciem decisões interlocutórias que recaiam unicamente sobre a relação processual […] podem ser objeto de recurso de revista») e dos factos nele compreendidos (o «acórdão da Relação que revoga uma decisão da Primeira Instância de extinção da instância por deserção»), a solução jurídica é x («o acórdão da Relação que revoga uma decisão da Primeira Instância de extinção da instância por deserção não aprecia uma decisão interlocutória que recaia unicamente sobre a relação proces- sual e não é, por isso, suscetível de recurso de revista), a proposição sindicada é uma pura norma de decisão, não constituindo, por isso, objeto idóneo de um controlo normativo de constitucionalidade. A reclamação deverá ser, pois, integralmente desatendida. III – Decisão Em face do exposto, decide-se indeferir a presente reclamação. Custas devidas pelas reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta, nos termos do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro, ponderados os critérios estabelecidos no respetivo artigo 9.º Lisboa, 26 de setembro de 2019. – Joana Fernandes Costa – Gonçalo Almeida Ribeiro (com declaração) – João Pedro Caupers. DECLARAÇÃO DE VOTO Subscrevo a decisão de não conhecimento do objeto do recurso por inidoneidade do mesmo, nos exatos termos desenvolvidos no Acórdão. As recorrentes podiam ter sindicado a constitucionalidade da norma, extraída pelo tribunal recorrido da alínea b) do n.º 2 do artigo 671.º do Código de Processo Civil, segundo a qual o «acórdão da Relação que revoga uma decisão de Primeira Instância de extinção da instância por

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