TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

232 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 4.ª) Por conseguinte, havendo já lei concretizadora, a presente questão de constitucionalidade redundará em determinar se as previsões normativas das disposições controvertidas, no caso em matéria das condições penais da obtenção da cidadania portuguesa, são conformes com as já mencionadas vinculações constitucionais. b) Princípio da proporcionalidade 5.ª) “Não podem ser consideradas como de restrição aquelas hipóteses em que a Constituição remete para uma determinação legislativa autónoma a própria configuração do conteúdo dos direitos e garantias fundamentais” (Vieira de Andrade). 6.ª) É esse precisamente o caso, pois aqui a Assembleia da República está constitucionalmente mandatada, por virtude da aludida imposição legiferante, para definir, constitutivamente, o conteúdo do “direito fundamental à cidadania portuguesa”. 7.ª) O “conteúdo essencial” (mínimo) passível de ser deduzido do teor dos artigos 4.º (puro reenvio para a lei e convenção internacional) e 26.º, n.º 1 (que se queda pela mera denominação do direito), é o de uma pretensão jurídica e imposição legiferante à emanação de lei (regime jurídico) regulando, de modo constitucionalmente con- forme, o acesso à cidadania portuguesa, e isso não se está a negar ao recorrido. 8.ª) Quanto à questão do caráter geral (vinculado) ou casuístico (“discricionariedade administrativa”) da deter- minação dos antecedentes criminais que servem como indício da idoneidade do requerente, a lei constitucional não institui ou revela objetivamente qualquer critério, pelo que esta matéria vai necessariamente deferida à “liber- dade de conformação” do legislador, ou seja, é matéria de escolha legal e não de decisão judicial. 9.ª) No caso em apreço, a opção legislativa por um critério de “cláusula geral” (vinculado), em detrimento de um critério “casuístico” (discricionário), pode ser abonado em impecáveis credenciais constitucionais, pois favorece um tratamento objetivo, igualitário e imparcial das pretensões de naturalização, o que mais dificilmente poderia ser conseguido por apreciações casuísticas ou de “discricionariedade administrativa”, as quais são naturalmente propícias a criar diversidade de tratamento, que se poderia revelar intolerável (artigo 13.º, n. os 1 e 2). 10.ª) Por outra parte, a apreciação da idoneidade do requerente da nacionalidade, nomeadamente através de critérios penais, não é um domínio natural, inelutável e indiscutível, da “liberdade de escolha” da administração – e dos juízos “subjetivos”, nomeadamente prognoses sobre “disposições pessoais” e do “âmbito de livre apreciação”, ainda que judicialmente fiscalizáveis, que lhe são intrinsecamente inerentes. 11.ª) Sendo certo, importa acrescentar, que a competência para fazer essa ponderação casuística já está prevista na lei, sendo deferida ao juiz penal da causa ou de execução das penas, os mais próximos das pessoas e dos factos em causa. 12.ª) Aliás, não são verdadeiramente alternativos os critérios da cláusula geral (vinculado) e casuístico (“discri- cionariedade administrativa”), pois têm subjacentes duas visões diferenciadas sobre o método preferível para apurar da idoneidade do requerente, que dependem assim de puras escolhas e preferências volitivas do legislador. 13.ª) Os tribunais, sob pena de ofensa do princípio constitucional de separação dos poderes, não se poderão substituir ao legislador em matéria de escolhas que, no seu âmago, relevam da pura política legislativa (artigo 111.º, n.º 1). 14.ª) Em suma, as normas jurídicas controvertidas nem são restritivas, nem são “excessivas” – no sentido em que, ceteris paribus quanto aos interesses públicos relevantes, não há solução alternativa que seja preferível, por menos intrusiva ou mais benigna para os interesses dos requentes – sendo certo que promovem um tratamento igualitário dos casos e, finalmente, em nada precludem o normal funcionamento do regime jurídico da identifica- ção criminal, pelo que não concorre violação do princípio constitucional da proporcionalidade. c) Efeitos das penas e condenações criminais 15.ª) O caso em apreço não é passível de ser legitimamente imputado ao domínio de aplicação e ao espírito da proibição constitucional dos efeitos necessários (“automáticos”) das penas, a qual visa fulminar aquelas conse- quências que resultam inelutavelmente, sem mediação de um juízo autónomo de ponderação, que não tem de ser necessariamente judicial ou administrativo, da prévia aplicação de penas ou condenações.

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