TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

260 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL criminoso ( criminal lifestyle ), o qual pode resultar de um de três fatores, a provar pela acusação: a condenação dizer respeito à prática de certos crimes (entre os quais, tráfico de estupefacientes, branqueamento de capitais, tráfico de pessoas ou de armas, direção de grupo terrorista, lenocínio, extorsão); o crime inserir-se numa sequência de atividade criminosa (o que exige que o agente tenha tirado do crime por que foi condenado benefício não inferior a 5.000 £ e que tenha sido condenado, no mesmo processo, por, pelo menos, três crimes de que tenha tirado idêntico benefício ou, nos seis anos anteriores ao início do processo, tenha sido condenado, pelo menos, em duas ocasiões, por um crime de que tenha tirado idêntico benefício); ou o crime ter sido cometido durante, pelo menos, seis meses e o condenado ter tirado dele um benefício não inferior a 5.000 £. Caso conclua pela existência de um modo de vida criminoso, o Tribunal determina, com recurso a presunções, o benefício obtido pelo condenado: presume-se que todos os bens transferidos para o condenado nos 6 anos ante- riores ao início do processo e todos os bens possuídos pelo condenado, em qualquer momento anterior à sentença condenatória, constituem resultado da sua atividade criminosa geral (“ general criminal activity ”), presumindo-se ainda que todas as despesas efetuadas no referido período temporal foram realizadas com bens da mesma prove- niência. Estas presunções podem ser ilididas pelo condenado mediante a prova de que certo bem ou rendimento é de origem lícita (podendo também o tribunal afastá-las quando conclua que a sua aplicação produz um risco sério de injustiça). Já o confisco administrativo é um procedimento in rem , que tem por objeto os bens obtidos através de ativi- dade criminosa, de valor superior a 10.000 £ ou os bens que se sub-rogam no lugar deles, sendo entendimento de alguma jurisprudência que as autoridades não têm de alegar e provar o cometimento de um crime determinado, devendo no entanto alegar e provar, “ on the balance of probabilities ”, que os bens procedem de factos que integram certo género ou géneros de crimes (fraude, roubo, etc.), mesmo que estes tenham sido praticados por pessoa diferente daquela que é a atual titular do bem, havendo divergência na jurisprudência sobre a questão de saber se, para prova da origem criminosa dos bens, basta a prova de que o respetivo titular não tem rendimentos lícitos que expliquem o seu modo de vida. Para além deste regime, vigora ainda no Reino Unido, o Drug Trafficking Act , de 1994, nos termos do qual se presume que os bens possuídos pelo arguido depois da condenação ou nos seis anos anteriores à instauração do processo foram recebidos como pagamento ou recompensa do tráfico de droga e que as despesas suportadas nesse período foram pagas com fundos procedentes do mesmo. O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, no caso Phillips contra o Reino Unido , em que estava em causa uma situação na qual, por força do referido Drug Trafficking Act de 1994, se presumia que os bens detidos pelo arguido no momento da condenação ou nos seis anos anteriores eram provenientes da prática de crimes, mais concretamente, do crime de tráfico de estupefacientes, por acórdão proferido em de 5 de julho de 2001 (acessível e m http://www.echr.coe.int/echr/) , entendeu que a aludida presunção não violava o direito ao processo equitativo, consagrado no artigo 6.º, n.º 1, da CEDH, uma vez que no caso mostravam-se assegurados os direitos de defesa, nomeadamente um processo judicial com audiência pública, notificação prévia do seu objeto e possibilidade de produção de provas documentais e orais, com vista ao afastamento da presunção. Referiu-se também que o artigo 6.º, n.º 2, da CEDH, onde se consagra a presunção de inocência do arguido em processo penal, sendo relativo à culpabilidade, não era aplicável ao procedimento previsto pelo Drug Trafficking Act de 1994 [sobre este Acórdão, cfr., Augusto Silva Dias, ob. cit. , pp. 42; e Pedro Caeiro, ob. cit. , pág. 319, Jorge Godinho, ob. cit. pág. 1352 e seg. e Henriques Gaspar, em “Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (direito penal e processual penal) 2001”, na RPCC, Ano 12, (2002), pág. 291].» De entre os desenvolvimentos normativos subsequentes, merece destaque a aprovação do Regulamento (UE) 2018/1805, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de novembro de 2018, relativo ao reconhe- cimento mútuo das decisões de apreensão e de perda, que veio reiterar o empenho da União em «assegurar uma maior eficácia na identificação, perda e reutilização de bens de origem criminosa» (considerando 3), dando novo passo no sentido de intensificar a cooperação judiciária entre os Estados-Membros naqueles domínios.

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