TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

278 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL janeiro de 2019, Proc. n.º 0452/17.0BEBJA; de 8 de novembro de 2017, Proc. n.º 0344/17; e de 3 de março de 2016, P. 01533/15). Já entre os segundos se conta seguramente o ato certificativo emitido pela secretaria do tribunal para efeitos irrelevantes para a tramitação de um dado processo, que não fora requerido pelas partes, nem lhes fora comunicado no âmbito do processo ou por causa dele. A questão que se coloca é a de saber se a exclusão da proteção conferida pela norma sub judice relati- vamente aos atos erróneos praticados pela secretaria judicial fora do próprio processo ou sem relevância no desenvolvimento normal dos seus termos processuais ofende o princípio da proteção da confiança na atuação dos serviços responsáveis pelo exercício da função administrativa de apoio à tramitação processual. A resposta não pode deixar de ser negativa. «Para que para haja lugar à tutela jurídico-constitucional da “confiança”», segundo jurisprudência constante deste Tribunal, «é necessário, em primeiro lugar, que o Estado (mormente o legislador) tenha encetado comporta- mentos capazes de gerar nos privados “expectativas” de continuidade; depois, devem tais expectativas ser legítimas, justificadas e fundadas em boas razões; em terceiro lugar, devem os privados ter feito planos de vida tendo em conta a perspetiva de continuidade do “comportamento” estadual; por último, é ainda necessário que não ocorram razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a não continuidade do comportamento que gerou a situação de expectativa.» (Acórdão n.º 128/09, desenvolvendo a posição expressa no Acórdão n.º 287/90, e mais recentemente reiterada, entre outros, nos Acórdãos n. os 379/17, 828/17, 175/18, 428/18 e 134/19). Ora, é ostensivo que a norma que constitui o objeto do presente recurso não gera expectativas algumas de que as partes possam aproveitar ou confiar em todo e qualquer comportamento da secretaria judicial. Pelo con- trário, distingue nos seus próprios termos entre os atos a respeito de um processo que sejam praticados dentro e fora desse processo, determinando que os segundos não são idóneos a criar uma aparência digna de tutela no processo a que se referem. Esta norma baseia-se obviamente no pressuposto de que as partes devem orientar-se pelo comportamento da secretaria dentro do processo, o que, na situação dos autos, significa que podiam e deviam conhecer a data do trânsito em julgado do acórdão que lhes havia sido oportunamente notificado. Resta, pois, concluir que a norma que constitui o objeto do presente recurso não viola o princípio da proteção da confiança. 9. O Tribunal Constitucional tem reiteradamente afirmado que o direito fundamental de acesso à justiça e a uma tutela jurisdicional efetiva mediante um processo equitativo não é incompatível com o estabelecimento de prazos e outros ónus processuais – sendo certo que «os ónus impostos não poderão, por força dos artigos 13.º e 18.º, n. os 2 e 3, da Constituição, impossibilitar ou dificultar, de forma arbitrária ou excessiva, a atuação procedimental das partes, nem as cominações ou preclusões previstas, por irremediáveis ou insupríveis, poderão revelar-se totalmente desproporcionadas face à gravidade e relevância, para os fins do processo, da falta cometida, colocando assim em causa o direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva (…).» (vide o Acórdão n.º 462/16). O n.º 6 do artigo 157.º estabelece uma cláusula geral impeditiva do cerceamento dos direitos processuais das partes por conta de erros imputáveis à secretaria. Aliás, para que possa dizer-se equitativo e modelado para garantir uma tutela jurisdicional efetiva, nenhum processo pode prescindir do respeito pelos princípios da boa fé e da leal cooperação na relação entre as partes, e entre estas e o tribunal (vide os artigos 7.º e 8.º do Código de Processo Civil e o Acórdão n.º 183/06). À luz desses padrões de conduta, é razoável exigir ao Estado que se iniba de retirar consequências dos vícios ou irregularidades que, sendo inteiramente imputáveis ao seu braço administrativo, determinam a eliminação de oportunidades ou vantagens processuais. A questão prende-se aqui com a extensão que tal imposição constitucional. Mais concretamente, importa saber se estes princípios constitucionais impõem, a essa luz, que todo e qualquer ato erróneo praticado pela secretaria, mesmo quando o seja fora do âmbito do concreto processo judicial que esteja em causa ou quando

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