TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

28 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL menos, um deles; e a gestante consente, também perante os beneficiários, em que lhe seja implantado esse mesmo embrião. O consentimento em apreço é também mais abrangente, uma vez que o seu objeto é não só a aplicação de uma técnica de PMA, mas todo o processo gestacional e o próprio parto. Daí a previsão no artigo 14.º, n.º 6, de que «os beneficiários e a gestante de substituição [sejam] ainda [– isto é, para além das informações respeitantes aos benefícios e riscos conhecidos resultantes da utilização de técnicas de PMA, bem como das suas implicações éticas, sociais e jurídicas –] informados, por escrito, do significado da influência da gestante de substituição no desenvolvimento embrionário e fetal». Deste modo, o consentimento dos beneficiários implica a vontade positiva de que o embrião criado com recurso ao seu material genético, implantado na gestante, desenvolvido por esta durante a gravidez e por ela dado à luz, seja tido como seu filho. Do mesmo modo, o consentimento da gestante traduz a vontade positiva de que a criança que vier a trazer no seu ventre e que vier a dar à luz não venha a ser sua filha, mas dos beneficiários. Esta autovinculação direcionada inerente ao consentimento prestado no âmbito da gestação de substituição explica a dificuldade em separá-lo de um acordo entre as partes. E, na verdade, faz todo o sentido acomodar as exigências relativas ao consentimento no próprio contrato. 41. Aliás, isso mesmo parece ter sido tentado no Decreto Regulamentar n.º 6/2017, de 31 de julho, que veio regulamentar a Lei n.º 25/2016, e no contrato-tipo entretanto aprovado, mas com o objetivo de reduzir ao mínimo as referências autónomas ao consentimento e fazer coincidir o acordo com a declaração unilateral de consenti- mento. Nos termos do artigo 3.º, n.º 1, daquele diploma, o CNPMA aprova o contrato-tipo de gestação de substitui- ção, do qual devem constar obrigatoriamente cláusulas tendo por objeto matérias enunciadas nas alíneas do n.º 3 do mesmo preceito. Entre estas, cumpre salientar, pela sua conexão com a questão do consentimento, as alíneas e) («[a] prestação de informação completa e adequada sobre as técnicas clínicas e os seus potenciais riscos para a saúde») e f ) («[a] prestação de informação ao casal beneficiário e à gestante sobre o significado e as consequências da influência do estilo de vida da gestante no desenvolvimento embrionário e fetal»), porquanto respeitam, respeti- vamente, às informações destinadas a garantir um consentimento informado previstas nos n. os 2 e 6 do artigo 14.º da LPMA. Verifica-se, deste modo, o esforço de lograr que, por via da aceitação de um contrato que obedeça ao contrato-tipo, se preste simultaneamente o consentimento exigido. Ainda assim, este surge autonomizado logo na alínea j) , respeitante aos «termos da revogação do consentimento ou do contrato e as suas consequências» (itálicos aditados). E, sobretudo, no seguinte preceito: «Artigo 4.º Declaração negocial Sem prejuízo do disposto na alínea e) do n.º 1 do artigo 142.º do Código Penal, as declarações negociais da gestante de substituição e dos beneficiários manifestadas no contrato de gestação de substituição, são livre- mente revogáveis até ao início dos processos terapêuticos de PMA.» Recorde-se que o preceito citado do Código Penal respeita à interrupção voluntária da gravidez realizada, por opção da mulher, nas primeiras dez semanas de gravidez. No contrato-tipo aprovado pelo CNPMA, já só se fala em «revogação do contrato», não para referir um acordo de revogação, mas a possibilidade de «qualquer uma das partes» livremente pôr termo ao contrato «até ao início do processo terapêutico de PMA» (cláusula 8.ª, n.º 1). Admite-se também a resolução (unilateral) do contrato nos casos de realização de interrupção voluntária da gravidez [cláusula 8.ª, n. os 1, parte final, e 2, só pela gestante, com referência à hipótese prevista no artigo 142.º, n.º 1, alínea e) , do Código Penal; cláusula 11.ª, por qualquer das partes, nas situações das alíneas a) ou b) do mesmo preceito]. Os deveres de informação, assim como o consen- timento prestado perante o médico constituem um pressuposto da assinatura do contrato, conforme referido no considerando g) do contrato-tipo [ainda que depois, nas cláusulas 2.ª, n.º 2, alínea a) , e 5.ª, alínea a) , se afirme

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