TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

305 acórdão n.º 502/19 72. Antes de passarmos à apreciação da questão substantiva suscitada nos autos, não poderemos deixar de, não só por razões de natureza lógico-jurídica mas, igualmente, de natureza processual – dando resposta ao convite formulado pela Exm.ª Sr.ª Conselheira relatora a fls. 207 e 208 dos autos -, procurar apurar se se encontra preen- chido, no caso vertente, “o específico pressuposto dos recursos de fiscalização de constitucionalidade interpostos ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC”, que possibilite que o Tribunal Constitucional conheça, a final, do seu objecto. 73. Atento o exposto, procurando dar resposta ao convite formulado pela Exm.ª Sr.ª Conselheira relatora, a fls. 207 e 208, e apesar de algumas dúvidas suscitadas pela equívoca formulação da douta sentença a quo , afigura- -se-nos ser de concluir que, embora implicitamente, a decisão impugnada recusou a aplicação da norma ínsita no artigo 194.º n.º 1 do Estatuto da Carreira do Pessoal Docente da Educação Pré-Escolar e dos Ensinos Básico e Secundário aprovado pelo Decreto Legislativo Regional n.º 21/2007/A, de 30 de agosto, na redacção dada pelo Decreto Legislativo Regional n.º 25/2015/A, de 17 de dezembro, com fundamento na violação do disposto no artigo 30.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, encontrando-se, consequentemente, preenchido o específico pressuposto dos recursos de fiscalização de constitucionalidade interpostos ao abrigo da alínea a) , do n.º 1, do artigo 70.º, da L.T.C. 74. Respondida a questão prévia de natureza processual, passámos a apreciar a vertente substantiva do presente dissídio, começando por abordar a questão da aplicabilidade do disposto no referido artigo 30.º, n.º 4, da Consti- tuição da República Portuguesa, às penas de natureza não criminal e, mais concretamente, às penas disciplinares. 75. Recorrendo à firme jurisprudência do Tribunal Constitucional, ilustrada pelo decidido no seu douto Acór- dão n.º 368/08, concluímos que o princípio constitucional nele encerrado é aplicável a todas as sanções e não apenas às de natureza criminal. 76. Aceite a aplicabilidade do disposto no artigo 30.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, tam- bém ao direito sancionatório não criminal, nomeadamente às penas disciplinares, procurámos apurar se a norma jurídica impugnada, ínsita no n.º 1, do artigo 194.º, do Estatuto da Carreira do Pessoal Docente da Educação Pré-Escolar e dos Ensinos Básico e Secundário aprovado pelo Decreto Legislativo Regional n.º 21/2007/A, de 30 de agosto, na redacção dada pelo Decreto Legislativo Regional n.º 25/2015/A, de 17 de dezembro, se revelaria susceptível de violar o princípio constitucional contido naquele preceito. 77. Assim, olhando à formulação do preceito constitucional e acolhendo os contributos doutrinários e juris- prudenciais relevantes, apurámos que o ditame nele contido implicaria, no caso vertente, que verificássemos se a aplicação da especificada sanção, a pena disciplinar de suspensão, à ora recorrente, envolveria, necessária e mecani- camente, a perda de qualquer direito profissional. 78. Deste jeito, e começando pelo segmento final, procurámos apurar se o impedimento da celebração de novo contrato por um período de três anos que decorre, nos termos do disposto no artigo 194.º, n.º 1, do Esta- tuto da Carreira do Pessoal Docente da Educação Pré-Escolar e dos Ensinos Básico e Secundário aprovado pelo Decreto Legislativo Regional n.º 21/2007/A, de 30 de agosto, na redacção dada pelo Decreto Legislativo Regional n.º 25/2015/A, de 17 de dezembro, da aplicação da sanção disciplinar da suspensão, consubstancia, para os efeitos do prescrito no n.º 4, do artigo 30.º, da Constituição da República Portuguesa, a perda de um direito profissional, tendo concluído que a restrição imposta pela norma impugnada – ao impedir a celebração de novo contrato e a prossecução do percurso profissional – limita, crucial e gravemente, durante um período significativo, o exercício desse direito constitucionalmente garantido. 79. Convictos da certeza de que a aplicação da sanção de suspensão produziria como efeito a perda de um direito profissional, coube-nos apurar se esse efeito se revelaria necessário ou automático. 80. Também nesta parte, inferimos que a mera condenação de um docente não pertencente aos quadros na pena disciplinar de suspensão, independentemente da consideração do facto sancionável por si praticado, impede- -o, necessária e automaticamente, de celebrar novo contrato por um período de três anos, impossibilitando-o, assim, temporariamente, de exercer a profissão escolhida, restringindo, ope legis , isto é, sem a mediação de uma apreciação ad hoc – judicial ou administrativa – a liberdade, constitucionalmente assegurada, de escolha da profis- são e do género de trabalho, consagrada no n.º 1, do artigo 47.º, da Constituição da República Portuguesa.

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