TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

336 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL deveres funcionais que valem, em princípio, para todo e qualquer funcionário público e que, por isso mesmo, favorecem o enquadramento da função pública como um todo, dentro das funções do Estado”, cabendo, por seu turno, na competência legislativa do Governo a “concretização” desse estatuto geral, a sua “complemen- tação, execução e particularização” (cfr. Pareceres n. os 22/79 e 12/82, in Pareceres da Comissão Constitucional, vols. 9.º, p. 48, e 19.º, p. 119, respectivamente), tendo este Tribunal mantido idêntica posição em arestos posteriores (cfr. Acórdão n.º 142/85, publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 6.º vol.)» (subli- nhado acrescentado) Bem assim, no Acórdão n.º 793/13, socorrendo-se do entendimento da doutrina: «A alínea t) “reserva à AR a matéria das «bases» do regime e âmbito da função pública (ou seja, o estatuto próprio da função pública como organização e como relação jurídica de emprego específica), bem como a delimitação do seu âmbito (ou seja, a demarcação das áreas em que os organismos e os servidores do Estado estão sujeitos àquele regime). Esta delimitação nem sempre é fácil […], mas deve interpretar-se no sentido da extensão da reserva da AR, sobretudo quando estiverem em causa , direta ou indiretamente, direitos fundamentais (acesso à função pública e cargos públicos, direito de exercício de profissão), […]. (vide Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, II, cit. , anot. XX ao artigo 165.º, p. 333; itálicos aditados)» (sublinhados acrescentados). Também por esta razão se pode concluir que a normação sub judice invade a reserva de competência legislativa da Assembleia da República em matéria de bases e âmbito do regime da função pública. 17. Além do mais, verifica-se que tratando-se da consagração de uma medida sancionatória que condi- ciona (negativamente) o acesso à docência no ensino público – e consagrada na Constituição a liberdade de escolha de profissão e de acesso à função pública no quadro dos direitos, liberdades e garantias (artigo 47.º da Constituição) –, a análise da conformidade constitucional da norma sub judice não deixa de convocar também a reserva parlamentar de competência legislativa consagrada na alínea b) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição. Como resulta da expressa enunciação da alínea b) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição – «É da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre as seguintes matérias, salvo autorização ao Governo: b) Direitos, liberdades e garantias» – e, bem assim, da jurisprudência exarada neste Tribunal, a reserva de competência legislativa parlamentar ali consagrada não se confina às bases ou ao regime geral dos direitos liberdades e garantias, abrangendo toda a intervenção legislativa reportada à matéria em causa, sendo que, para mais, não se mostra a reserva confinada à emissão de leis restritivas de direitos liberdades e garantias, embora assuma neste domínio uma fundamental importância (cfr., designadamente, Acórdãos n. os 128/00, 255/02, 563/03, 620/07, 119/10, 362/11, 578/14 e 509/15). Como se escreveu no Acórdão n.º 578/14: «Dir-se-á, em primeiro lugar, que os direitos, liberdades e garantias (…) são uma daquelas matérias em que o nível de competência legislativa reservada à Assembleia da República é mais “exigente”, porquanto diz respeito a toda a regulamentação legislativa e não apenas às bases ou ao regime geral de um dado domínio (cfr. a taxonomia proposta por J. J. Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. II, Coimbra Editora, 4.ª ed. revista, 2010, p. 325, reiterada, entre outros, nos acórdãos n. os 494/99, 258/06 e 793/13, disponí- veis em www.tribunalconstitucional.pt ) . Essa maior exigência – que vale tanto para as restrições, como para a res- tante intervenção normativa conformadora, acondicionadora ou até ampliadora de direitos, liberdades e garantias – traduz-se, desde logo, na circunstância de estes domínios não poderem, com exceção do decreto-lei autorizado, ser objeto de diploma legislativo, configurando-se o poder regulamentar do Governo e dos órgãos regionais como meramente “executivo”. O mesmo é dizer, portanto, que debruçando-se um dado normativo – não emanado pela Assembleia da Repú- blica nem pelo Governo, com autorização legislativa – sobre matéria atinente a direitos, liberdades e garantias (a), a sua conformidade constitucional, a nível competencial, está dependente do caráter “não inovatório” – rectius ,

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=