TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

376 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL submetida à apreciação do Tribunal Constitucional revestia uma dimensão normativa idónea para constituir o objeto de um recurso de constitucionalidade. Limita-se o reclamante a reiterar que enunciou claramente a alegada questão de inconstitucionalidade normativa que pretende ver apreciada e a assinalar que os limites dos poderes de cognição deste Tribunal em sede de fiscalização concreta da constitucionalidade não obstam à apreciação de interpretações normativas inconstitucionais. Verifica-se que a discordância do recorrente – pese embora expressa sob a forma de uma questão de inconstitucionalidade normativa – é, por mais uma vez, dirigida ao juízo hermenêutico que conduz à explici- tação das situações incluídas na previsão legal e ao juízo subsuntivo de enquadramento da situação no artigo 188.º, n.º 10, do CPP, em termos que não podem ser revistos no âmbito do presente recurso de constitu- cionalidade. Isto, dados os limites dos poderes de cognição do Tribunal Constitucional no âmbito dos recursos de fiscalização concreta de constitucionalidade. É certo que, em sede de fiscalização concreta, o conceito funcional de “norma”, para efeitos da respetiva fiscalização de constitucionalidade, inclui não apenas o enunciado de determinado preceito, em si mesmo tomado, mas ainda a interpretação (normativa) que lhe foi dada pela decisão judicial de que se interpõe recurso. Contudo, não é isso que se verifica na situação dos autos. Verifica-se, ao invés, que as razões apresentadas pelo recorrente no requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional (e, bem assim, na presente reclamação) e perante o tribunal a quo (em sede do recurso interposto da decisão de primeira instância) são dirigidas à própria interpretação das disposições legais pertinentes feita pelas instâncias (que considera erróneas) – seja na decisão judicial então recorrida, seja na decisão do TRP que a manteve – e ao juízo subsuntivo formulado no caso dos autos, o que não constitui objeto idóneo de fiscalização de constitucionalidade. À ponderação das circunstâncias pro- cessuais dos autos e determinação do regime legal aplicável não pode o Tribunal Constitucional contrapor decisão diversa, sob pena de se desvirtuar o sistema recursivo vigente. 8.4. Também não assiste razão ao reclamante quando se insurge contra a conclusão de, em qualquer caso, não ter sido a pretensa interpretação normativa que erige como objeto do presente recurso a razão determinante da decisão tomada nos autos, assim faltando o pressuposto de admissibilidade do recurso rela- tivo à ratio decidendi . Com efeito, para além de, como assinalado na Decisão Sumária ora reclamada, o artigo 125.º do CPP não ter tido expressa (ou sequer relevante) aplicação no caso vertente, resulta dos autos que a interpretação feita pelo Tribunal recorrido do artigo 188.º, n.º 10, do CPP, norma que confere poder ao juiz do julgamento de ordenar a junção aos autos de novas transcrições, não tem por determinante que esse poder seja exercido por iniciativa do Ministério Publico – o que constitui o argumento essencial do recorrente na construção da alegada violação das garantias de defesa do arguido e do princípio da igualdade processual –, concluindo assim a Decisão Sumária reclamada que «para o tribunal a quo aquele poder-dever é exercido pelo juiz seja oficiosamente, seja a requerimento do MP ou da defesa, sendo determinado pelo objetivo último da desco- berta da verdade e da boa decisão da causa, como decorre aliás, da própria letra do n.º 10 do artigo 188.º do CPP e do n.º 1 do artigo 340.º do mesmo Código que o Tribunal aplica e o recorrente tem por inaplicável ao caso dos autos». Deste modo, a razão de decidir do Tribunal recorrido não coincide com a dimensão que o recorrente pretende ver sindicada pelo Tribunal Constitucional, o que, dado o caráter instrumental dos recursos de fiscalização concreta da constitucionalidade, também obstaria – como se conclui na Decisão Sumária ora reclamada – à apreciação da questão de constitucionalidade tal como enunciada pelo recorrente.

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