TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

431 acórdão n.º 543/19 Sublinhe-se ainda que, nem mesmo relativamente ao direito à saúde (artigo 64.º da Constituição), o princípio da gratuitidade é absoluto, admitindo a previsão de taxas moderadoras para acesso ao Serviço Nacional de Saúde. Como resulta do Acórdão n.º 330/89, «(…) o conceito de gratuitidade (…) será compa- tível [com] a exigência (ou a exigência em certos casos) aos utentes do SNS de “taxas moderadoras” (…). Tais taxas visam tão-só “racionalizar a utilização das prestações” facultadas pelo serviço em causa: o seu objectivo (…) é unicamente o de “moderar a procura de cuidados de saúdes, evitando assim a sua utilização para além do razoável”». O mesmo raciocínio será transponível para as custas judiciais – e para as custas cobradas no TAD -, dado que também nesta área, onde nem sequer impera idêntico princípio, se procura a racionalização na utilização da justiça, uma vez que os recursos são limitados e se pretende reservá-los para aqueles que mais deles careçam. Independentemente de outras ponderações, trata-se aqui de aplicar um princípio geral de cobertura e imputação de custos, sendo legítima a adoção de medidas aptas a assegurar a sustentabilidade económica de um serviço público prestado por entidades privadas e a imputação do respetivo custo sobre quem, con- cluindo pela necessidade da utilização desse serviço público, especialmente dele beneficia. Não questionando tais premissas, o que o Tribunal recorrido defende é que o montante das custas cobradas no TAD por processos arbitrais necessários de valor até € 30 000 é demasiado elevado, em si mesmo e por comparação com o montantes cobrados nos tribunais estaduais, podendo atingir montantes muito superiores ao valor da causa, como se considerou ser o caso, o que constitui «um condicionamento excessivo e injustificado do acesso aos tribunais por via tributária ou paratributária», especialmente censurá- vel porque as partes não têm a possibilidade de optar, em alternativa, pelo recurso aos tribunais do Estado, que deixaram de ter competência na matéria. O problema levantado situa-se, pois, ao nível do princípio constitucional da proibição do excesso apli- cável em matéria de restrição de direitos fundamentais dos cidadãos (artigo 18.º, n.º 2, da Constituição). É a seguinte a argumentação concretamente desenvolvida pelo Tribunal Central Administrativo Sul em apoio dessa jurisprudência, aliás transcrita doutro aresto do mesmo tribunal: «(…), [N]o presente caso, a taxa de arbitragem, arbitragem, aliás, forçada, é de 750 euros, os encargos adminis- trativos são de 75 euros e, mais importante, os honorários do colégio arbitral são de 2500 euros. Por exemplo, se este mesmo processo corresse nesta Jurisdição, o autor eventualmente perdedor pagaria um total de 408 euros no TAC de taxa de justiça, ou seja, cerca de 9 vezes menos do que no TAD, e de 204 euros de custas neste tribunal superior, mais alguns custos ou encargos administrativos (fotocópias, etc.) – cf. RCP. Reconhece-se, porém, que tais custos – segundo o RCP – seriam os mesmos caso o valor da pena (o valor pro- cessual) fosse de apenas 100 ou 50 euros. Mas a dimensão do problema, a dimensão dos valores e as diferenças de valores são bem diferentes, quando comparando com o caso em apreço. O cerne do problema está, obviamente, (i) nos honorários e (ii) na ‘taxa de arbitragem (forçada), mesmo podendo ou não ser casuisticamente reduzida. Assim, temos, por um lado, os honorários numa arbitragem forçada, que não existem nos TACs, e, por outro lado, temos a taxa de arbitragem (forçada), equivalente à taxa de justiça pelo impulso processual no RCP, cujo valor no RCP seria aqui de 2 UCs, 204 euros, muito inferior à do TAD. Dois aspectos distintos e relevantes para a questão em apreço. Assim, aqui, para o TAD arbitrar um litígio no valor de cerca de 3000 euros ou de 100 euros, as custas, onde se incluem nesta sede os honorários dos árbitros, serão sempre superiores a 3000 euros. E é este o problema concreto que o recorrente levanta no presente recurso. Ora, esta situação paratributária não faz sentido, ou melhor, não tem lógica de justiça, nem de proporcionali- dade, justiça e proporcionalidade exigidos pelos artigos 2.º e 18.º/2 da CRP também quanto ao acesso à justiça e à tutela jurisdicional efectiva (cf. artigos 20.º e 268.º da CRP). Não é justificável, justo ou equilibrado condicionar o acesso à justiça com custas processuais de valor muito superior ao valor processual. O que, aliás, adquire particular gravidade quando se trata de arbitragem necessária ou forçada, como foi o caso presente (…).

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