TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

502 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL interesses legalmente protegidos dos administrados) lesem –, o que decorre do n.º 4 do artigo 268.º da Cons- tituição é o dever de conformar o processo impugnatório de tal modo que seja idóneo a apreciar a pretensão de invalidade (ou de inexistência jurídica) incidente sobre as decisões dos órgãos da Administração (ou dota- dos de poderes materialmente administrativos) que, ao abrigo de normas de direito público, visem produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta». 16. A possibilidade de institucionalizar formas de composição não jurisdicional de conflitos, nos termos do n.º 4 do artigo 202.º, e de submissão de litígios a uma jurisdição arbitral, como prevê o n.º 2 do artigo 209.º, não significa que a Constituição obrigue o legislador a criar vias arbitrais para a resolução de todos os litígios ou que o recurso a um tribunal estadual não seja ainda a principal via de acesso ao direito. A criação de uma via arbitral no domínio do contencioso administrativo ou tributário não é uma obrigação do legis- lador, decorrente da Constituição. Aliás, com base em reservas de jurisdição estadual constitucionalmente fundadas, deve reconhecer-se a existência de certos limites à constituição de tribunais arbitrais – alguns deles precisamente no domínio de litígios emergentes de relações jurídicas administrativas ou tributárias. Neste contexto, como o Tribunal Constitucional afirmou no Acórdão n.º 230/13, Plenário, ponto 13, «ainda que os tribunais arbitrais constituam uma categoria de tribunais e exerçam a função jurisdicional, não pode perder-se de vista que essa é uma forma de jurisdição privada, (…). O direito fundamental de acesso aos tribunais constitui tendencialmente uma garantia de acesso a tribunais estaduais em resultado da necessária conexão entre esse direito e a reserva de jurisdição, que apenas poderá caracterizar uma reserva de jurisdi- ção arbitral quando o acesso ao tribunal arbitral seja livre e voluntário». A este propósito Pedro Gonçalves observa que a garantia do artigo 20.º, n.º 1, da Constituição, é a do «direito de acesso a tribunais estaduais, não tendo sentido dizer-se que ali se garante o acesso a tribunais a constituir por iniciativa dos interessados. O que a instituição de tribunais arbitrais voluntários representa, ou pode representar, é a voluntária renúncia ao direito de acesso aos tribunais do Estado» ( Entidades Privadas com Poderes Públicos, Coimbra, 2005, pág. 565, nota 450). Por outro lado, existindo a possibilidade de recurso aos tribunais tributários estaduais que, como se viu, constitui a principal via de acesso ao direito, não se pode considerar que o regime adjetivo não proporcione aos cidadãos meios efetivos de defesa dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos. Por essa razão, não pode considerar-se que, assegurado que está o recurso aos tribunais estaduais, a não consagração de uma determinada via arbitral no domínio tributário represente uma restrição do direito de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efetiva, consagrado no artigo 20.º da Constituição. Não existindo uma restrição de um direito fundamental, não existe razão para mobilizar o princípio da proporcionalidade no presente caso. 17. Conclui-se, assim, que a norma que determina que o âmbito da jurisdição arbitral abrange preten- sões relativas a impostos, não incluindo outros tributos cuja administração seja conferida por lei à Autoridade Tributária, decorrente do artigo 2.º, alínea a) , da Portaria n.º 112‑A/2011, de 22 de março, não é incons- titucional nem por violação do princípio da igualdade, na vertente de proibição do arbítrio, previsto no artigo 13.º, n.º 1, da Constituição, nem por violação do direito de direito de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efetiva, consagrado no artigo 20.º da Constituição. III – Decisão Pelo exposto, decide-se: a) Não julgar inconstitucional a norma que determina que o âmbito da jurisdição arbitral abrange pretensões relativas a impostos, não incluindo outros tributos cuja administração seja conferida por

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