TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

509 acórdão n.º 546/19 restrição das normas afetadoras dos direitos e liberdades fundamentais» (ou, dito de outro modo, do princípio da «intervenção mínima do direito penal»).  12. Do exposto resultam para o caso sub judicio , desde já, duas conclusões preliminares relevantes: que o prin- cípio da aplicação da lei penal mais favorável terá, em alguma medida, aplicação em matéria de responsabilidade financeira, não obstante se estar num domínio sancionatório que não se confunde com o da responsabilidade criminal; e que tal aplicação deve ser ponderada em concreto mesmo quando a lei nova seja posterior à condena- ção por infração financeira (ainda que não transitada), podendo haver lugar à extinção ou redução da respetiva responsabilidade financeira, por decisão de reapreciação do caso, desde que verificados os pertinentes pressupostos. 13. Posto isto, cabe averiguar quais esses pressupostos e se os mesmos se aplicam de igual forma às duas moda- lidades de responsabilidade financeira: sancionatória e reintegratória. Para tanto, importa desde logo distinguir e caracterizar essas duas espécies de responsabilidade. 14. A LOPTC, no seu Capítulo V, sob a epígrafe «Da efetivação de responsabilidades financeiras», integra um conjunto de preceitos que permitem estabelecer uma clara distinção entre a responsabilidade financeira reintegra- tória, tratada especificamente na Secção II (artigos 59.º a 64.º), e a responsabilidade financeira sancionatória, sobre a qual rege a Secção III (artigos 65.º a 68.º). Tal distinção resulta, desde logo, da diferente natureza das consequên- cias que advêm para quem incorre numa e noutra dessas modalidades de responsabilidade financeira: a responsa- bilidade reintegratória gera a condenação do responsável na reposição de quantias objeto das infrações cometidas (cfr. artigos 59.º, n.º 1, e 60.º da LOPTC) e a responsabilidade sancionatória determina a aplicação de multas (cfr. artigos 65.º, n.º 1, e 66.º, n.º 1, da LOPTC), sendo que as duas responsabilidades podem ser cumulativas, uma vez que «[a] aplicação de multas não prejudica a efetivação da responsabilidade pelas reposições devidas, se for caso disso», de acordo com o disposto no n.º 6 do artigo 65.º da LOPTC. 15. A primeira ocorre perante factos típicos caracterizados como alcance, desvio de dinheiros ou valores públi- cos, pagamentos indevidos e não arrecadação de receitas (cfr. artigos 59.º, n. os 2, 3 e 4, e 60.º); a segunda refere-se à prática de factos típicos que correspondem, quer a violações de normas de índole substantiva (elencados no artigo 65.º, n.º 1), quer a violações de normas de caráter processual (elencados no artigo 66.º, n.º 1). A primeira implica uma reposição das quantias objeto das respetivas infrações, acrescida dos juros de mora sobre esses montantes, cal- culados «nos termos previstos no Código Civil», conforme dispõe o n.º 6 do artigo 59.º da LOPTC (ainda que sem prejuízo da possibilidade de redução ou relevação da responsabilidade, em caso de atuação negligente, de acordo com o n.º 2 do artigo 64.º); a segunda envolve uma diferenciação na medida das multas a aplicar, em função de critérios estabelecidos na lei, de que resultam a alteração da moldura da sanção (consoante o autor aja com dolo ou negligência – cfr. artigos 65.º, n. os 2, 4 e 5, e 66.º, n. os 2 e 3), a graduação da sanção dentro da respetiva moldura (atentos vários parâmetros, em que avultam a gravidade dos factos e o grau de culpa – cfr. artigo 67.º, n.º 2) ou a atenuação especial da sanção (apenas para a responsabilidade sancionatória substantiva – cfr. artigo 65.º, n.º 7), sendo ainda admitida, em certas condições, a dispensa da sanção (também para a responsabilidade sancionatória substantiva – cfr. artigo 65.º, n.º 8) ou mesmo a relevação da responsabilidade (tanto para a responsabilidade sancionatória substantiva como para a responsabilidade sancionatória processual – cfr. artigos 65.º, n.º 9, e 66.º, n.º 3, in fine ). 16. Apesar das evidenciadas diferenças entre as duas aludidas modalidades de responsabilidade financeira, apresentam ambas em comum a delimitação do respetivo tipo de ilícito quanto à conduta punível dos agentes do facto, sendo aplicável o mencionado artigo 61.º, n.º 2, da LOPTC, designadamente na sua nova redação, quer à responsabilidade reintegratória (em cuja Secção aquela disposição se integra), quer à responsabilidade sancionatória (quanto a esta, por remissão do artigo 67.º, n.º 3) – e isso independentemente de as exigências típicas contidas nesse preceito serem caracterizadas como condições objetivas de punibilidade (conforme acolhido na decisão recor- rida), como causas de exclusão da ilicitude ou sob qualquer outro enquadramento dogmático pertinente. 17. Porém, voltam a distinguir-se as duas espécies de responsabilidade financeira quanto ao concernente regime subsidiário. Estabelece-se expressamente, para a responsabilidade sancionatória, e quanto à respetiva matéria subs- tantiva, uma remissão para o «disposto nos títulos I e II da parte geral do Código Penal» (cfr. artigo 67.º, n.º 4),

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