TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

533 acórdão n.º 547/19 efetiva, consagrado no artigo 20.º da Constituição, por entender que, inexistindo domicílio convencionado, o mero depósito da carta numa das moradas presumidas do devedor não oferece garantias suficientes de que a noti- ficação chegou ao conhecimento do destinatário. Vejamos se assim é.              7. O artigo 20.º da Constituição garante a todos o direito de acesso aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, impondo igualmente que esse direito se efetive – na conformação normativa pelo legislador e na concreta condução do processo pelo juiz – através de um processo equitativo (n.º 4); à luz deste princípio, os regimes adjetivos devem revelar-se funcionalmente adequados aos fins do processo e conformar-se com o princípio da proporcionalidade, não estando o legislador, pese embora a margem de liberdade de que dispõe, autorizado a criar obstáculos que dificultem ou prejudiquem, arbitrariamente ou de forma desproporcionada, o direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva. Como concretização prática do princípio do processo equitativo e corolário do princípio da igualdade, o direito ao contraditório traduz-se essencialmente na possibilidade concedida a cada uma das partes de “deduzir as suas razões (de facto e de direito)”, de “oferecer as suas provas”, de “controlar as provas do adversário” e de “discretear sobre o valor e resultados de umas e outras” (cfr. Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, I, Coim- bra, 1956, p. 364, citado no Acórdão n.º 510/15). As regras do contraditório e da proibição da indefesa que lhe vai associada assumem relevo muito particular a propósito da disciplina das notificações “ lato sensu ”, por serem os atos processuais destinados a facultar às partes o conhecimento da existência ou do estado do processo, colocando-as em condições de exercitarem o seu direito de defesa, face às pretensões da parte contrária, ou de exercerem os demais direitos de intervenção processual (cfr. Lopes do Rego, Os princípios constitucionais da proibição da indefesa, da proporcionalidade dos ónus e comina- ções e o regime da citação em processo civil in Estudos em Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa , Coimbra, Coimbra Editora, 2004, p. 837). No âmbito do procedimento de injunção, como vimos, o requerido toma conhecimento da pretensão formu- lada contra ele através da notificação do requerimento de injunção, constituindo esta, por tal razão, um garante da possibilidade efetiva de o devedor se defender daquela pretensão. Por conseguinte, o regime previsto para esta notificação deve fornecer garantias suficientes de que o seu conteúdo chegou ao conhecimento do destinatário. Na decisão recorrida considerou-se que a modalidade de notificação prevista nos n. os 3 e 5 do Regime Anexo, ao não fornecer tais garantias, restringia de forma desproporcional o direito do contraditório, privilegiando a cele- ridade e a desformalização processual. 8. Na notificação por via postal simples, prevista nos n. os 3 e 5 do artigo 12.º, presume-se (ou, melhor dizendo, nas palavras de Lopes do Rego, op. cit. , p. 851, ficciona-se) a notificação pessoal com o simples ato de depósito de uma carta no recetáculo postal de um domicílio presumido, ficando a partir daí o requerido sujeito ao consequente efeito da formação, contra ele, de um título executivo. Note-se que é sobre ele que recai o ónus da prova de que a notificação não chegou ao seu conhecimento. A lei não exige que se recolha qualquer outro dado que permita confirmar que a residência que consta das bases de dados – ou pelo menos, se uma delas – corresponde à atual residência do notificando. Outra circunstância que compromete a praticabilidade e a fiabilidade da consulta das bases de dados é o facto de a pesquisa ser feita a partir dos elementos de identificação do requerido que o requerente fez constar do reque- rimento de injunção. Como refere Lopes do Rego, op. cit, p. 855, «na verdade, tal consulta arrisca-se a introduzir no processo um “rol” de todas as residências que correspondem a determinado “nome”, ignorando-se obviamente se se estará perante um mesmo réu com diversas residências ou perante cidadãos diferentes com um mesmo nome e, naturalmente, domicílios diferenciados». Ainda a respeito da especificidade desta consulta, remetemos para o que se disse no Acórdão n.º 632/06, embora no caso a ele subjacente, estivesse comprovado que o réu não residia na morada indicada nas bases: «Com efeito, afigura-se desproporcionado, em face das respetivas consequências referidas supra , considerar definitivamente como atual, isto é, sem qualquer possibilidade de infirmação, a morada que consta das bases de

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=