TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

543 acórdão n.º 547/19 social (artigos 2.º e 3.º, n.º 1, da Lei n.º 7/2007, de 5 de fevereiro, na redação vigente). A lei define-o como um «documento de identificação múltipla» (artigo 6.º, n.º 1) que designadamente inclui, em circuito integrado, sujeito a elevadas condições de segurança, informação respeitante à morada [artigo 8.º, n.º 1, alínea b) , que é, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 13.º, «o endereço postal físico, livremente indicado pelo cidadão, correspondente ao local de residência habitual». Sobre o titular do cartão de cidadão recai ainda, por expressa previsão legal, o dever de atualizar a morada constante do cartão de cidadão (artigo 13.º, n.º 3), sob pena de incorrer na prática de uma contraordenação (artigo 43.º, n.º 3). O dever de comunicar e atualizar a morada constante desse documento fundamental de identificação visa assegurar a possibilidade de comunicação eficaz entre o Estado e o cidadão. […] A informação sobre a residência do requerido que as secretarias judiciais estão autorizadas a utilizar para o efeito de comunicação do ato de notificação, nos termos do artigo 12.º, tem, pois, origem em bases de dados públicas que, pelo menos no que respeita aos serviços de identificação civil, fiscal e da segurança social, assumem uma robusta compleição normativa. Mais importante do que isso, a coincidência das moradas obtidas desse modo qualificado constitui um indicador seguro da fiabilidade da informação que elas contêm. Tais elementos, associados ao reconhecimento de que a generalidade das pessoas, no exercício de uma cidadania responsável, mantém em segurança o recetáculo postal da sua residência e procede à consulta regular da mesma (cfr. Acórdão n.º 182/06), conferem à notificação realizada por via postal simples nos termos dos n. os 3 e 4 do artigo 12.º, com observância do formalismo previsto no artigo 12.º-A, n. os 2 e 3, aplicável , solidez bastante para suportar a presunção de recebimento (conhecimento) da notificação dela decorrente. Por outro lado, contrariamente ao que sucede com as normas ou interpretações julgadas inconstitucionais nos citados Acórdãos n. os 104/06, 632/06 e 222/17, a norma que constitui objeto do presente recurso não confere à presunção de conhecimento (ou cognoscibilidade) do ato de notificação feito nesses termos caráter absoluto ou inilidível. O requerido pode, na oposição à execução que tem por base o título executivo formado nos termos do n.º 1 do artigo 12.º, arguir a falta de notificação, alegando e demonstrando que não chegou a ter conhecimento do ato de notificação por facto que não lhe é imputável (cfr. artigos 188.º, n.º 2, alínea e), 729.º, alínea d), e 857.º do CPC) , o que permitirá acautelar, pelo menos, as situações de ausência prolongada e as situações de mudança de residência (ainda) não comunicada aos serviços de identificação civil, factos que são facilmente passíveis de prova testemunhal. Embora se reconheça, na linha sustentada pelo Acórdão n.º 222/17, que o regime das notificações por carta de depósito não é imune ao risco de desencontro, assim exemplificado, a interpretação que agora se avalia, contrariamente àquela que foi objeto dessa decisão de inconstitucionalidade, admite a possibilidade de invocação em juízo dessas e doutras situações configu- ráveis como causas justificativas do não recebimento (conhecimento) efetivo da notificação, solução que, se não previne a ocorrência do risco, impede a produção automática de consequências jurídicas penalizadoras para todos aqueles que se encontrem comprovadamente nessas circunstâncias, justamente censurada nesse aresto. Por tais razões, afigura-se que a norma do artigo 12.º, n. os 3 e 4, na dimensão sindicada, não ofende o conteúdo essencial do direito de defesa que a Constituição, como não podia deixar de ser, também reconhece aos notifican- dos no âmbito dos procedimentos de injunção. 2.6. E, nesse quadro legal, também não há razões para considerar que a solução em causa, ao dispensar a certeza do efetivo conhecimento subjetivo da notificação e se bastar com a colocação desta última na área de cognoscibili- dade do notificando, viola o princípio da proporcionalidade. É razoavelmente evidente que uma solução desse tipo é apta à prossecução de finalidades constitucionalmente relevantes, como a de assegurar uma decisão judicial em prazo razoável, não apenas para os titulares dos direitos invocados nos procedimentos de injunção, mas para todos aqueles que recorrem aos tribunais e beneficiam da libertação de recursos humanos e materiais que a rápida resolução judicial do tipo de litígios abrangidos por esses procedimentos permite. Tal finalidade, vista na perspetiva ampliada de defesa da capacidade de resposta de todo o sistema judicial num contexto de multiplicação crescente do número e tipo de litígios, dificilmente poderia ser alcançada através de

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