TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

549 acórdão n.º 572/19 SUMÁRIO: I - Os preceitos em causa reportam-se a categorias normativas, dotadas de generalidade e abstração – a comunicabilidade da qualidade de funcionário nas situações de comparticipação, designadamente de coautoria material – sendo o referente do controlo de constitucionalidade a interpretação normativa resultante da conjugação de dois preceitos e a norma deles extraída, em termos gerais e abstratos: per- gunta-se se a transmissão, determinada por lei geral e abstrata (artigo 28.º, n.º 1, do Código Penal), de uma qualidade jurídica (definida em termos gerais e abstratos na norma instrumental do artigo 386.º do Código Penal) de um indivíduo a outro, numa situação de coautoria material (conceito jurídico geral e abstrato) configura uma violação do princípio da legalidade. II - O princípio da legalidade constitui, essencialmente, uma garantia de certeza e de segurança na determi- nação das condutas humanas que são punidas pelo direito criminal; nesta aceção, o princípio da legali- dade manifesta-se no princípio da tipicidade, cujo sentido é o de impor ao legislador penal o ónus de, ao definir os tipos legais de crime, o fazer através da descrição precisa e certa do comportamento proibido, sem recurso a formulações vagas, incertas ou insuscetíveis de delimitação; o princípio da tipicidade implica necessariamente uma exigência de determinabilidade do conteúdo da lei penal, desde logo por estar em causa a proteção do indivíduo perante o exercício do poder punitivo do Estado. III - Da concatenação do artigo 382.º com o artigo 28.º, n.º 1, ambos do Código Penal, não se descortina violação do artigo 29.º, n.º 1 da Constituição, na dimensão normativa aqui questionada; os citados preceitos caracterizam-se pelo emprego de uma linguagem clara e concreta, sem recurso a expressões vagas e difusas, permitindo aos destinatários da norma conhecer os comportamentos que nela são tipificados como crime e capacitando-os, portanto, para orientar a sua conduta em conformidade com Não julga inconstitucional os artigos 382.º e 28.º, n.º 1, ambos do Código Penal, na inter- pretação segundo a qual alguém que não seja funcionário, tal como definido na alínea b) do n.º 1 do artigo 386.º do Código Penal, pode ser condenado pelo crime de abuso de poder, quando essa qualidade de funcionário se verifique nos seus comparticipantes e lhe seja estendida. Processo: n.º 1383/17. Recorrentes: Particulares. Relator: Conselheiro Pedro Machete. ACÓRDÃO N.º 572/19 De 17 de outubro de 2019

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=