TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

55 acórdão n.º 464/19 Nos termos da Lei n.º 49/2008, de 27 de agosto, a investigação criminal “compreende o conjunto de diligên- cias que, nos termos da lei processual penal, se destinam a averiguar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a sua responsabilidade e descobrir e recolher as provas, no âmbito de processo”. Na verdade, os serviços de informações não possuem quaisquer atribuições policiais ou de investigação crimi- nal, estando-lhes legalmente vedadas tais atividades. Há, pois, (é o entendimento do TC) “uma distinção radical entre informações e investigação criminal, o que impede os oficiais de informações de intervirem no processo penal”. Ainda que a recolha de informações possa ser utilizada no processo penal, a recolha para esse fim tem que se dirigir a um crime já praticado. Ora, a recolha de informações pela SIRP, porque preventiva, não se orienta para uma atividade investigatória de crimes já praticados ou em execução. A conclusão perentória do TC é que a atividade de informações produzida pelo SIRP, porque não se dirige à descoberta da autoria de um crime, não reveste a natureza de investigação criminal. (...) São, pois, procedimentos administrativos que, devendo respeitar os direitos, liberdades e garantias, não obedecem aos princípios jurídico- -constitucionais conformadores do processo penal (Acórdão cito p. 24). Da relevância da natureza da entidade de controlo Diferentemente do que acontecia com o Decreto da AR sob o qual incidiu o processo de fiscalização preventiva da constitucionalidade que culminou no Acórdão n.º 403/2015, não se prevê na LO em apreço que o controlo do acesso aos dados de tráfego seja feito por via de uma “comissão de controlo prévio” de natureza administrativa, e como tal qualificada no referido acórdão, apesar de integrada por magistrados judiciais.  No caso presente, nos termos do artigo 8.º da LO, o controlo judicial e a autorização prévia do acesso dos oficiais de informações do SIS e do SIED a dados de telecomunicações e Internet são efetuados por uma formação das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça, constituída pelos presidentes das secções e por um juiz designado pelo Conselho Superior da Magistratura, de entre os mais antigos destas secções. A intensidade do controlo do acesso aos dados de tráfego por parte dos oficiais de informações é também con- sideravelmente superior à que se previa no decreto julgado inconstitucional em 2015, de modo a conferir garantias de necessidade, adequação e proporcionalidade ao pedido efetuado. Todavia, entendem os requerentes que as alterações assim efetuadas não afastam as decisivas razões que levaram à declaração de inconstitucionalidade do Decreto n.º 426/XII. Se é certo que as secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça não podem ser qualificadas como órgãos administrativos, sendo este Tribunal inequivocamente um órgão de natureza jurisdicional, não é menos certo que as funções que a LO lhes atribui – em tudo estranhas às funções que até agora este Tribunal foi chamado legalmente a desempenhar – não constituem matéria de processo criminal. Assim como no Acórdão n.º 241/02 o TC julgou inconstitucional que, em processo laboral, pudesse ser pedido por despacho judicial aos operadores de telecomunicações informações relativas aos dados de tráfego e à faturação detalhada de linha telefónica, por “não constituir matéria de processo criminal”, sendo tal entendimento confir- mado em acórdãos posteriores (citados no Acórdão n.º 403/15, p. 22) designadamente no âmbito do processo civil, também agora é forçoso concluir pela inconstitucionalidade do disposto na LO. É que o que está em causa não é tanto a natureza administrativa ou judicial da entidade de controlo (embora tal natureza não seja irrelevante) mas a questão de saber se o controlo judicial efetuado se insere, ou não, no âmbito do processo penal. E pelas razões acima expendidas à luz da jurisprudência constitucional, sobre a distinção radical entre infor- mações e investigação criminal, que impede os oficiais de informações de intervirem no processo penal, parece aos proponentes que a resposta só pode ser negativa». 4. Notificado para responder, o Presidente da Assembleia da República veio oferecer o merecimento dos autos, aproveitando, no entanto, para explicar, em síntese, o seguinte:

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