TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

566 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL decisões vinculam os tribunais tributários de 1.ª instância –, abre-se uma via de recursória excecional desti- nada a restabelecer a unidade de interpretação e aplicação do direito (o que, de resto, nem sequer se afigura incompatível com a ideia de «um contágio das decisões judiciais pelas arbitrais, as tais que são proferidas por técnicos mais especializados» – como aventa Carla Castelo Trindade, ob. cit. , p. 483). Ora, é justamente essa a finalidade do recurso por oposição previsto no artigo 25.º, n.º 2, do RJAT, a tramitar, com as necessárias adaptações, segundo o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (cfr. o n.º 3 do citado artigo 25.º). 6. A recorrente entende que tal solução normativa, devido a não contemplar (também) uma via de recurso com fundamento na oposição entre decisões arbitrais, é inconstitucional por violar o princípio da igualdade, o direito de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efetiva e ainda os princípios da justiça, da segurança jurídica e da proteção da confiança. Mas não tem razão. 7. É sabido que fora do âmbito do direito criminal (e com ressalva dos casos excecionais em que a lesão resulte imediatamente do ato jurisdicional) a Constituição não consagra um direito a um duplo grau de juris- dição, gozando o legislador ordinário, por isso, de uma ampla liberdade de conformação neste domínio (cfr., entre muitos, o Acórdão n.º 396/14, acessível, assim como os demais adiante referidos, a partir da ligação https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/ ). De todo o modo, esta liberdade não é ilimitada. Desde logo, porque a própria previsão constitucional de tribunais superiores torna intolerável a pura e simples eliminação da faculdade de recorrer em todo e qualquer caso. Mas, mais decisivamente, aquela liberdade encontra um outro limite (um limite interno) quanto às próprias condições de admissibilidade do recurso, que decorre do princípio do Estado de direito (artigo 2.º da Constituição) e, mais especificamente, do princípio da igualdade. A este propósito, valem também para o processo tributário as seguintes considerações feitas com referência ao processo civil no Acórdão n.º 328/12: «[C]omo se recordou no Acórdão n.º 360/05, no processo civil, o que o legislador tem de assegurar sempre a todos, sem discriminações de ordem económica, é o acesso a um grau de jurisdição. Mas, se a lei previr que o acesso à via judiciária se faça em mais que um grau, tem ele que abrir a todos também a essas vias judiciárias, garantindo que o acesso a elas se faça sem discriminação alguma (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 163/90, de 23 de maio de 1990, Boletim do Ministério da Justiça n.º 397 – junho – 1990, p. 77). Aquela margem de discricionarie- dade (a ampla margem de discricionariedade na concreta conformação e delimitação dos pressupostos de admissi- bilidade e do regime dos recursos que deve ser reconhecida ao legislador ordinário em processo civil) tem, porém, como limite a não consagração de regimes arbitrários, discriminatórios ou sem fundamento material bastante, em obediência ao princípio da igualdade (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 202/99, de 6 de abril de 1999, in Boletim do Ministério da Justiça n.º 486 – maio de 1999, p. 49). É a esta luz – da não consagração constitucional do direito a [um] 2.º grau de jurisdição neste domínio, por um lado, e da proibição do arbítrio no estabelecimento do critério de recorribilidade, quando o legislador opte por abrir a possibilidade de recurso, por outro – que importa analisar o critério normativo adotado […].» Com efeito, numa perspetiva de igualdade material ou substantiva – aquela que subjaz ao artigo 13.º, n.º 1, da Constituição e que se traduz na igualdade através da lei –, a igualdade jurídica corresponde a um conceito relativo e valorativo assente numa comparação de situações em função da finalidade da norma: as mesmas, na medida em que, à luz de tal finalidade, sejam consideradas iguais, devem ser tratadas igualmente; e, na medida em que sejam desiguais, devem ser tratadas desigualmente, segundo a medida da desigualdade. Tal implica a determinação prévia da igualdade ou desigualdade das situações em causa, porquanto no plano da realidade factual não existem situações absolutamente iguais. Para tanto, é necessário comparar situações em função de um certo ponto de vista: a ratio da norma a aplicar. Por isso, a comparação indispensável ao

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