TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

568 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL escolhas do legislador. No entanto, o que os dois princípios claramente proíbem é que subsistam na ordem jurídica regimes legais que impliquem, para as pessoas, diversidades de tratamento não fundados em motivos razoáveis.» 8. A inadmissibilidade de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo de decisões dos tribunais arbitrais em matéria tributária com fundamento em oposição com outras decisões arbitrais, ainda que possa ser considerada discutível no plano político-legislativo (designadamente, por tais decisões também poderem originar correntes jurisprudenciais significativas, tendo em conta a recorrência das mesmas questões tribu- tárias e o aumento do recurso à arbitragem), não é arbitrária. Com efeito, tal solução normativa, para além de se adequar ao princípio da irrecorribilidade das decisões arbitrais enformador do RJAT (e até de o acentuar) – a qual traduz uma opção constitucionalmente legítima do legislador, e não uma restrição de um hipotético direito ao recurso –, encontra uma justificação plausível na própria diferença estatutária e funcional entre os tribunais arbitrais e os tribunais superiores da jurisdição administrativa e fiscal do Estado. Os primeiros não integram a hierarquia judiciária e decidem em 1.ª instância; as suas decisões são, em regra, definitivas e, para além da força persuasiva dos respetivos fundamentos, não projetam efeitos sobre as decisões de outros tribunais. Já os segundos assumem necessariamente uma função orientadora quanto à boa interpretação do direito aplicável, vinculativa para os tribunais de 1.ª instância da respetiva ordem. Com efeito, as decisões destes últimos são, em princípio, recorríveis para os tribunais superiores, que, ao conhe- cerem e decidirem tais recursos, padronizam e uniformizam o direito aplicável. A norma ora sindicada visa, deste modo, assegurar que, uma vez estabelecida determinada orientação quanto a certa «questão fundamental de direito», vinculativa para os tribunais estaduais que julgam em 1.ª instância os litígios de natureza fiscal, a mesma seja igualmente respeitada pelos tribunais arbitrais em maté- ria tributária, prevenindo, desse modo, contradições na interpretação e aplicação dos mesmos normativos. Trata-se, por conseguinte, de uma solução ordenada à segurança, à previsibilidade e, em última análise, à justiça na resolução dos litígios jurídico-tributários. Pelo exposto, a aludida norma tem um fundamento racional e não põe em causa o direito de acesso à justiça. 9. No que se refere à alegada violação dos princípios da justiça, da segurança jurídica e da proteção da confiança, cumpre ter presente que a solução do artigo 25.º, n.º 2, do RJAT assenta, desde logo, no princípio da irrecorribilidade das decisões arbitrais (cfr. supra o n.º 4). Acresce o caráter facultativo do recurso à arbitra- gem tributária pelo contribuinte (vide ibidem , in fine ). Nesse sentido, refere-se muito justamente na decisão ora recorrida: «[O] tribunal arbitral é uma opção do contribuinte. Quando o contribuinte opta por recorrer ao tribunal arbitral, ainda que sabendo que está vedado o julgamento segundo a equidade e que os árbitros estão obrigados a decidir segundo o direito constituído (art.º 2.º, n.º 2 do RJAT), corre o risco de receber uma decisão desfavorável e irrecorrível, ou pelo menos recorrível em casos limitados, e sabe que essa é uma das possibilidades que resultam das regras do jogo, sendo, também dentro desses limites, que se baliza a sua expectativa jurídica.» Por outro lado, atento o caráter ad hoc de cada tribunal arbitral, as respetivas decisões são únicas e destinadas exclusivamente ao caso concreto, vinculando apenas quem é parte no respetivo processo. Conse- quentemente, não se vê como é que a partir de uma decisão arbitral anterior em certo sentido podem nascer expetativas juridicamente relevantes de que casos semelhantes versando as mesmas questões fundamentais de direito venham a ter idêntica decisão. Tal uniformidade de soluções só poderia ser assegurada por via da recorribilidade das decisões arbitrais – uma solução expressa e legitimamente afastada pelo legislador e com a qual quem opta pelo recurso à arbitragem necessariamente se conforma. A norma do artigo 25.º, n.º 2, do RJAT ora sindicada não viola, assim, os aludidos parâmetros consti- tucionais da justiça, da segurança jurídica e da proteção da confiança.

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