TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

582 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL «I – Do objeto do presente recurso: Por meio de Requerimento de Interposição de Recurso dirigido ao Tribunal Constitucional, veio o recorrente suscitar a apreciação da inconstitucionalidade das seguintes normas jurídicas, na dimensão interpretativa que ora se cita: a. Artigo 50.º n.º 5 do Código Penal [CP], na dimensão interpretativa normativa segundo a qual é admissível que a suspensão na execução da pena aplicada em concreto possa ser fixada em dobro do tempo máximo da pena abstrata prevista na moldura penal do tipo legal de crime. b. Artigo 51.º alínea c) do n.º 1, em conjugação com o artigo 50.º n.º 2, todos do CP, na dimensão interpre- tativa normativa segundo a qual é admissível ao tribunal subordinar o arguido a um dever de pagamento de uma quantia monetária muito elevada, suscetível de colocar em causa a sua vivência digna em comunidade. Ora, entende o recorrente, conforme melhor se apurará das alegações de recurso infra , que a interpretação dada às disposições legais supra mencionadas, sufragada pelo Tribunal da Comarca de Lisboa Oeste – Sintra, na sentença proferida em 8 de março de 2018, e confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa, no acórdão datado de 12 de dezembro de 2018, enferma de inconstitucionalidade por violação do princípio da proibição do excesso e do prin- cípio odiosa sunt restringenda , consagrados no artigo 18.º n.º 2 da Constituição da República Portuguesa [CRP]. II – Das Alegações propriamente ditas; II.1 – Da inconstitucionalidade da norma prevista no n. º 5 do artigo 50. o do Código Penal [CP], na dimensão interpretativa normativa segundo a qual é admissível que a suspensão na execução da pena aplicada em concreto possa ser fixada em dobra do tempo máximo da pena abstrata prevista na moldura penal do tipo legal de crime. Por meio de sentença datada de 08 de março de 2018, veio o Tribunal a quo, condenar o aqui recorrente na pena de 5 (cinco) meses de prisão, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p.e.p pelo art.º 292.º n.º 1 do Código Penal, suspendendo a execução da mesma pena nos termos e ao abrigo do artigo 50.º n.º 5 do Código Penal, pelo período de 2 (dois) anos. A fundamentação da medida de condenação efetuada pelo Tribunal a quo encontrou fundamento na dimensão interpretativa normativa segundo a qual é admissível que a suspensão na execução da pena aplicada, em concreto, possa ser fixada em dobro do tempo máximo da pena abstrata prevista na moldura penal do tipo legal de crime. Conforme se irá demonstrar de forma cristalina nas presentes Alegações de Recurso, tal interpretação é incons- titucional, por violação do artigo 18.º n.º 2 da CRP. a. Da natureza da suspensão da execução da pena; Atendendo à classificação das penas, a suspensão da execução da pena de prisão é uma pena de substituição em sentido próprio, isto é, trata-se de uma pena não privativa da liberdade, que pressupõe a prévia determinação da pena de prisão com vista a ser aplicada em vez desta última. Desta feita, temos que, para que estejamos perante uma pena de substituição em sentido próprio, é necessário o preenchimento de um duplo requisito: que tenha, por um lado, um carácter não institucional, isto é, seja cum- prida em liberdade; e que pressuponha, por seu turno, a prévia determinação da pena de prisão, para ser aplicada, em vez desta. Por todo o exposto, haverá que concluir pela manifesta dependência funcional e material entre a pena principal e a respetiva execução da suspensão da pena. Neste mesmo sentido, poder-se-á afirmar que a suspensão da pena é tida como uma forma de individualização da pena principal, já que surge no último momento do procedimento penal: o da escolha da pena principal. Deste modo, a suspensão da execução da pena de prisão é ela mesma uma restrição aos direitos, liberdades e garantias do condenado, estes últimos com consagração constitucional. Deste modo, dever-se-á aplicar à concretização da suspensão da execução de pena, os mesmos critérios e princí- pios aplicáveis à concretização da pena principal, entre os quais se contam os critérios de prevenção geral e especial que presidem à escolha e dosimetria ou determinação da medida da pena, bem como, designadamente, o princípio da proibição do excesso e o princípio odiosa sunt restringenda , ambos consagrados no artigo 18.º n.º 2 da CRP. b. Do princípio da proibição do excesso e do princípio odiosa sunt restringenda ;

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