TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

584 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL abstrata – i. e. em 2 (dois) anos – viola os princípios da proporcionalidade e proibição do excesso, sendo despropor- cional à concreta ameaça penal, tutelada pelo crime de condução de veículo, em estado de embriaguez. De facto, manifesto se torna que, entendeu o legislador que a ameaça penal refletida no crime vindo de referir fica acautelada – em apelo a um juízo de prevenção geral e especial – mediante a aplicação de uma pena máxima de prisão fixada no período de 1 (um) ano. Sendo, como tal, manifestamente desproporcional que se suspenda a execução dessa mesma pena pelo dobro do seu tempo máximo legalmente admitido em abstrato, não se almejando das exigências de prevenção geral e especial que possam sustentar tal interpretação, uma vez que se encontram em contradição com as mesmas exigên- cias que presidiram à fixação de uma pena máxima no crime cuja execução da pena se visa suspender. Devendo, como tal, a interpretação do artigo 50.º n.º 5, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 94/2017, ser efetuada fazendo apelo a uma interpretação sistemática e não literal, no cumprimento do artigo 18.º n.º 2 da CRP. Mais se diga que, a desproporcionalidade derivada da interpretação sufragada é manifestamente gritante tendo em conta que a restrição, no período da execução da suspensão da pena, do livre arbítrio e determinação do con- denado, é manifestamente superior, não só ao tempo da concreta pena principal aplicada, como igualmente, à moldura máxima da pena em abstrato. O que, no limite, transforma a suspensão da execução da pena em medida mais gravosa – à revelia da intenção legislativa – do que a própria pena de prisão cuja execução se visa suspender, como igualmente, no limite, desvirtua de efeito útil à sua execução. II.II Da inconstitucionalidade da norma prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 51.º, em conjugação com o n.º 2 do artigo 50.º, todos do CP, na dimensão interpretativa normativa segundo a qual é admissível ao tribunal subordinar o arguido a um dever de pagamento de uma quantia monetária muito elevada, suscetível de colocar em causa a sua vivência digna em comunidade. Por meio da em crise e já referida sentença datada de 08 de março de 2018, confirmada pelo acórdão do Tribu- nal da Relação de Lisboa, datado de 12 de dezembro de 2018, a suspensão da execução da pena de prisão foi sujeita à imposição, ao condenado, do dever de pagar a quantia de 10 000 € (dez mil euros) ao Centro de Reabilitação de Alcoitão. A fundamentação da imposição do referido dever, ao condenado, encontrou fundamento na dimensão inter- pretativa normativa segundo a qual é admissível ao tribunal subordinar o arguido a um dever de pagamento de uma quantia monetária muito elevada, suscetível de colocar em causa a sua vivência digna em comunidade. Conforme se irá demonstrar tal interpretação é manifestamente inconstitucional, por violação do artigo 18.º n.º 2 da CRP. a. Da ratio legis subjacente à subordinação da suspensão da execução da pena a concretos deveres de conduta; A subordinação da suspensão da execução da pena de prisão à imposição de concretos deveres pelo Tribunal, nos termos do artigo 51.º n.º 1 do CP, tem de respeitar o principio da proporcionalidade e não proibição do excesso e princípio odiosa sunt restringenda , contidos no artigo 18.º n.º 2 do CP. Ou seja, imperioso se torna, por um lado, que o condenado se encontre em condições de cumprir os referidos deveres e, por outro, que os mesmos deveres sejam revestidos de necessidade, adequação e racionalidade. b. Dos limites constitucionais à imposição de deveres à suspensão da execução da pena; Ora, a interpretação da norma prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 51.º, em conjugação com o n.º 2 do artigo 50.º, todos do CP, na interpretação normativa que prescreve a obrigação imposta ao condenado de pagar, no período de 1 (um) ano, ao Centro de Reabilitação de Alcoitão, a quantia de 10 000 (dez mil euros), enquanto dever da execução da suspensão da pena, colocando em risco a vivência digna em comunidade do condenado, é inconstitucional por violação do princípio da proibição do excesso, previsto no artigo 18.º n.º 2 do CRP. Deste modo, a interpretação anterior redunda numa excessiva e desproporcional restrição ao exercício de direi- tos fundamentais pessoais e sociais, consequência da subordinação da suspensão da execução da pena à imposição

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