TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

596 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL preferência por qualquer outra das demais penas de substituição e verificando-se ambos os referidos pres- supostos, o tribunal tem o poder-dever de a aplicar. Tal como sucede com as demais penas de substituição (à exceção da prestação de trabalho a favor da comunidade), a determinação da medida concreta da pena de suspensão de execução da prisão – mais con- cretamente, do período de suspensão – assume total autonomia relativamente à fixação medida concreta da pena principal substituída, devendo ocorrer sob incidência dos critérios estabelecidos no artigo 71.º do Código Penal. Na ausência de qualquer fator legal de indexação, tal autonomia tem, na verdade, uma dupla dimensão: de acordo com o regime estabelecido no n.º 5 do artigo 50.º do Código Penal, a duração do período de sus- pensão não depende, nem da medida concreta da pena de prisão aplicada a título principal, nem do limite máximo da moldura abstrata prevista para o crime subjacente à condenação. 10. Correspondendo embora à solução originariamente acolhida no Código Penal de 1982, tal regime não vigorou continuadamente, pelo menos em parte, até ao momento presente. Procedendo à vigésima terceira alteração ao Código Penal, a Lei n.º 59/2007, de 4 de setembro, ao mesmo tempo que elevou de três para cinco anos a medida concreta da pena de prisão suscetível de ser substituída pela suspensão da execução da pena, estabeleceu, no n.º 5 do artigo 50.º, um citério de cor- respondência entre a pena aplicada a título principal e a duração do período de suspensão: este teria uma «duração igual à da pena de prisão determinada na sentença», desde que não inferior a um ano. Tal critério foi, no entanto, abandonado no âmbito da quadragésima quarta alteração ao Código Penal, levada a cabo pela Lei n.º 94/2017, de 23 de agosto, que conferiu ao n.º 5 do respetivo artigo 50.º a sua redação atual. A Lei n.º 94/2017 teve na sua origem na Proposta de Lei n.º 90/XIII. De acordo com a Exposição de Motivos que acompanhou tal Proposta, a revisão empreendida visou, no «caso da fixação do período de suspensão da execução da pena de prisão», regressar «à solução que vigorou até à revisão de 2007 do Código Penal, de modo a dissociar o tempo da pena de suspensão do tempo da pena de prisão e a reafirmar o princípio de que este deve ser determinado em função da culpa e das finalidades consignadas às penas». Como nota Maria João Antunes, na sequência da revisão operada pela Lei n.º 94/2017, «[f ]oi reintro- duzida a regra de que a medida concreta da suspensão da execução da pena de prisão é determinada de forma autónoma, segundo os critérios do artigo 71.º, n.º 1, do CP […]. A determinação autónoma da medida con- creta da suspensão da execução da pena de prisão é, de resto, mais consentânea com a sua natureza de pena de substituição em sentido próprio (cfr. Ac. do STJ n.º 13/2016)» ( Penas e Medidas de Segurança , Coimbra, Almedina, 2017, p. 81). 11. O argumento que explica que a fixação do quantum do período de suspensão não dependa da medida concreta da pena de prisão é, por maioria de razão, aquele que permite compreender a inexistência de qualquer vinculação ao limite máximo da pena abstratamente cabida ao tipo legal de crime – solução que, ao contrário da primeira, nunca foi, de resto, acolhida pelo legislador penal. É que, enquanto o limite máximo da moldura penal traduz a necessidade de atender, de entre todas as possíveis formas de realização típica, às de maior gravidade conjeturável, de modo a assegurar que, também nestes casos, a medida concreta da pena a aplicar possa vir a corresponder ao limite da culpa e às exigências de prevenção, já a duração do período de suspensão exprime a exigência de que a ameaça de privação da liberdade se mantenha durante o período de tempo necessário a poder constituir para o condenado um eficaz contraestimulo à reiteração do comportamento delituoso, ao mesmo tempo que assegura à pena não detentiva as propriedades necessárias para acautelar o risco de a ausência de privação de liberdade vir a ser entendida como uma injustificada indulgência na prevenção e reação contra o crime.

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